domingo, 17 de janeiro de 2021

NA CRUZADA DO CONFINAMENTO, A IGREJA À FRENTE !

                                                                      


No pico da invernia, em que mar havemos de navegar, senão no ‘silêncio ensurdecedor’ da pandemia?...  De tão silencioso por dentro e  tão trovento por fora, que até mexe com as muralhas das cidades, abala os arcos triunfais dos palácios presidenciais e manda cerrar os portões gótico-romanos das catedrais. Das catedrais, das sés metropolitas e das modestas ermidas rurais.

         Eis-nos chegados ao epicentro  das operações: armamento anti-covid! Obedecendo ao velho adágio – em tempo de guerra não se limpam armas – de nada vale dissecar, direi, empatar, divertir, divergir, enlameando as mãos e o ambiente com as causas a montante. Agora é o tempo da guerra. É o confinamento. É o fechar de portas ao grosso dos ajuntamentos para que se abram hipóteses de vitória contra esta e a outras patologias.

         Fechar as portas das igrejas. Por todas as razões, a hierarquia das Igrejas (a católica e as demais) deveria estar na vanguarda desta gigantesca cruzada sem tréguas. E é neste campo semântico que interpreto o pensamento de Antero de Quental: “Na grande marcha da história, o santo é  quem vai à frente”

Primeiro, porque a Igreja não é artigo de consumo imediato, perecível: não é centro comercial, não é farmácia, não é banco, não é posto de abastecimento. E ainda que se lhe queira dar interpretação extensiva ou metafórica, os fármacos da Igreja, as proteínas, os combustíveis, os valores que ela porventura oferece são de outro câmbio e de outra essência que não os de primeiro antídoto contra o vírus. São ‘produtos’ de ordem supra-natural, espiritual, que se reproduzem na mentalidade e na sensibilidade do indivíduo. Precisamente, deste subsolo de ideias e valores é que vai brotar o suplemento necessário para enfrentar, com sólida armadura de pensamento, a guerrilha dos paióis do século XXI.  A essencial e estrategicamente certeira está no confinamento.

É polimórfica, mimética, transumante a história da Igreja oficial. Não a de Jesus de Nazaré! A Igreja institucional começou na clandestinidade das catacumbas romanas, depois (com o Imperador Constantino, desde 313) foi-se afeiçoando aos salões dourados, galgou tronos imperiais, soube ser fascista com os regimes fascistas, soube adaptar-se aos poderes nacionalistas – veja-se a Igreja na China, na Russa e outras – serpenteou silenciosamente  nos escolhos de regimes ditatoriais vigentes, enfim, abandonou a pureza congénita do Nazareno e habituou-se ao triunfalismo mundano, de grandes eventos, banhos de multidão, prestígio assistencial, omnipresente.

E agora?... Como reeducar o povo crente, ensinando-lhe a hierarquia de valores, a subsidiariedade (que não a essencialidade) de muitos dos ofícios e devoções dentro das quatro paredes do Templo? Quando entenderão os ‘fiéis’ que, nesta conjuntura, a capela, a igreja, a catedral, a basílica estão dentro da sua própria casa, em cuidada união com as respectivas famílias?...

Neste domingo, o Grande Livro conta-nos o método e o ritual com que o Nazareno chamou – em termos litúrgicos, hoje diríamos “ordenou” – André e seu irmão Pedro, este predestinado para pontífice-líder dos futuros apóstolos. “Em casa, no lugar onde Ele morava” (Jo.1,39).  Não foi no Templo de Jerusalém, com pompa e circunstância, com barretes tricórnios e anéis de ouro engrossados pelos aplausos da multidão. Foi no ‘confinamento’ silencioso da sua humilde casa de Nazaré!

Na sequência destes considerandos e servindo-lhes de apoio e confirmação, não posso deixar de felicitar o nosso conterrâneo Bispo José de Ornelas, actualmente titular de Setúbal e presidente da CEP (Conferência Episcopal Portuguesa)  que na semana transacta decretou para todas as dioceses de Portugal a suspensão temporária de baptismos, crismas e casamentos. Recordo, ainda, que o nosso Bispo Nuno Brás, aquando do pico deste vírus na Madeira, ter afirmado expressamente, há quase um ano: “Temos de substituir a tradicional pastoral de eventos por uma pastoral de acompanhamento”.

A Igreja tem de ser a primeira – “à frente”! – na observância e no incentivo de todas as normas de defesa por entre este mar tormentoso que nos coube atravessar. Paradigma sublime e caso exemplaríssimo é o da Catedral de  Salisbury  (na foto), Reino Unido, que perante a turbulência desta hora abriu as portas e, sob os arcos ogivais do vetusto templo, ofereceu as instalações para que os habitantes da cidade recebessem a vacina anti-Covid.

Que generosidade, realismo e beleza! Só me lembra o nosso Padre António Vieira, na catedral de São Luis do Maranhão, há mais de 400 anos: “Nesta capital do Nordeste brasileiro, mais valera haver hospital e não haver igreja. Mas se tal não for possível, transforme-se esta igreja em hospital, que Deus ficará mui contente disso”!

Cumpriu-se a profecia em Salisbury, Reino Unido, em 2021 !!!

 

17.Jan.21

Martins Júnior

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