sábado, 5 de junho de 2021

O AMBIENTE É UMA CRIANÇA…

                                                                     


          

No Dia Mundial do Ambiente prolonga-se e confirma-se o Dia Mundial da Criança, um tríptico cronológico, 1-3-5, que nos transporta para a simetria perfeita entre uma e outra sinonímia  e que me inspirou o  título deste blog de fim-de-semana: o Ambiente é uma Criança.

         E é-o, em toda a linha, porque no ambiente ecológico mais puro, tudo se renova, tudo renasce, desde as profundezas do oceano até à magnitude da esfera celeste. Mas, no jogo mais íntimo dos contrastes, não será menos certo afirmar que a Criança é o Ambiente, se por Ambiente condensarmos todos os segmentos e valências em que o homem nasce e cresce, desde a sua concepção no silêncio uterino do seio materno.

         Nesta mais ampla semântica ambiental, relacionada com a criança, tem sido paisagem idílica, emotiva - repetida e diferida por todo arquipélago da Madeira e Açores – que dá pelo nome sacro-romântico de “Primeira Comunhão”. Optei por este qualitativo, porque todo o ritual que envolve o acontecimento exala um perfume de encanto primaveril, em que a criança é rainha e a flor a sua dama-de-honor, grinaldas infantis e os pais em volta, formando o séquito de pajens improvisados. É, sem dúvida, a aliança mais genuína entre o sagrado e o romântico.

         Mas há quem não se deixe ficar embevecido na envolvência etérea do Tabor ou na revoada tangente do cenário primo-comungante. Por mais estranho que pareça, eu estou nesse grupo. Vejo algo mais além da beleza ternurenta dos neo-comungantes. Vejo e quase toco em plena evidência empírica a grande incógnita da pedagogia da Criança, no seu sentido holístico, em que se integra a educação espiritual, também designada educação religiosa. Sou daqueles que não se contentam com liturgias baptismais de bebés, com especiosas logísticas de Primeiras Comunhões ou com o ‘mestrado’ dos Crismas apa/amadrinhados. Recordo a judiciosa observação de um bispo, algures no continente português, acerca desta mesma questão: “Colegas (falava aos bispos presentes) não nos iludamos: o Sacramento do Crisma é, para grande parte dos jovens, a porta de saída da Igreja. Desaparecem, E se voltam é só para serviços pontuais e esporádicos”.

         O que decididamente me preocupa não é o acesso à Mesa Comunitária, bem como o espectáculo que a rodeia. O que importa, acima de tudo, é o que fica na substância daquele ‘Pequeno-Grande Ser’ que acede ao acto sacramental, ou seja,  o conteúdo espiritual  que deixe a Criança serena, segura e feliz. E mais: que ela deseje voltar ao convívio fraterno e interprete o sagrado, dentro dos limites da sua capacidade intelectiva, sem temores e sem ilusões.

É grande o perigo. Por experiência própria, garanto que é mais fácil dar uma aula ao 11º/12º ano do que dar uma catequese esclarecida e à medida de uma Criança. Porque se há campos propícios às chamadas fakenews, a religião ou as religiões são dos mais férteis. Muito cuidado e muita ponderação quando se fala do sagrado! A este propósito, cito Vittorino Andreoli, em “AO LADO DAS CRIANÇAS”: “Para a Criança, todo o mundo é mistério e cada ensinamento pode assumir as características de uma mensagem sagrada”.

Descendo ao chão da vida, jamais esquecerei o desabafo de uma das mães dos neo-comungantes: “O mais importante disto tudo é transmitir valores às crianças”.  Volto a citar o mesmo Autor: “A Religião ou o contacto com Deus não devem ser limitados ao âmbito restrito da missa dominical ou da oração em caso de necessidade, mas como trama de todo o tecido da vida”. Aqui entra a mundividência dos valores.

Ao ouvir aquela mãe, gente do povo, ocorreu-me a Carta Pastoral da Conferência Episcopal Portuguesa, em 6 de Janeiro de 2002, onde refere que “a educação religiosa deve lançar as bases sólidas para os valores espirituais e humanos, onde se aprende a ser pessoa e viver em relação comunitária e em espírito de serviço ao homem  à sociedade”. Na mesma direcção, poderia desdobrar outras tantas propostas que me preocupam na pedagogia espiritual dos mais novos. No entanto, prefiro trazer o testemunho de quem, antes de mim, teve as mesmas intuições transformadoras:

“Se a paróquia (Igreja) conseguisse comunicar o princípio evangélico de comportamento humano, cumpriria uma função diria quase terapêutica em relação a uma sociedade como a nossa, demasiado cheia de individualismo, narcisista e esquecida das oportunidades que o facto de pertencer a uma comunidade de exercer o direito ao amor e ao perdão oferece”. (Vittorino Andreoli).

No Dia Mundial do Ambiente, eis uma preocupação e um anseio perante o encantamento das Crianças convidadas à Mesa Eucarística, na esperança de que cresçam e se desenvolvam numa plena atmosfera de espiritualidade saudável.

 

05.Jun.21

Martins Júnior       

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