terça-feira, 31 de agosto de 2021

“SALTOS ALTOS” NO AFEGANISTÃO E NO FUNCHAL – A LUTA É DELAS !

                                                                             


Quando digo “Afeganistão” digo todo o mundo feito e todo o mundo a haver. E quando digo “Funchal” plasmo toda a ilha e todos os arquipélagos. Porque o que vai passar-se amanhã no Teatro ‘Baltazar Dias’ rompe todos os mares e todas as fronteiras, sejam as geográficas, sejam as temporais. É um “caso cósmico”, com raízes inarrancáveis, com marcas incicratizáveis.

         O tema envolve o corpo inteiro da história humana, tal qual o peritoneu concentra todos os movimentos metabólicos do organismo fisio-biológico que nos mantém de pé. Obliterá-lo ou mesmo camuflá-lo com suaves crepes é adiar a solução. Trata-se da definição identitária da Mulher – desde a primeira à última – neste deambular dialéctico da história. Há quem lhe atribua outros rostos: emancipação feminina, igualdade de género, luta contra a violência doméstica, complementaridade homem-mulher, entronização da condição feminina…

         Seja qual o figurino, o mundo sempre se defrontou com este drama que, em estrito rigor valorativo, nunca deveria existir. Não vou desdobrar-me em teses, antíteses ou sínteses, já proficientemente elaboradas por abalizados investigadores. Apenas abrirei dois trilhos para chegar à nascente pantanosa que envenenou os rios ultra-milenares da condição humana e que não pára de contaminar os afluentes do mundo onde navegamos. Resumo-os assim:           

         Primeiro, a biologia empírica e, por isso, enviesada que dá razão à força braçal, à moldura dos membros, enfim, à conclusão tribal que faz do macho o emissor iniciático e da fêmea o receptáculo passivo ou, por outras palavras, dá supremacia absoluta ao semeador e obediência servil à terra em cujo seio a semente se faz flor e fruto. Esta visão injectada pelo mais rasteiro olhómetro e aceite pelos códigos dos senhorios possantes, relegando a Mulher à condição de frágil colono, é esta visão que, oriunda da selva, toma conta dos castelos urbanos. Quem porá fim ao empirismo cego, mas embalsamado e perfumado?...

         Segundo (aqui vêm o bálsamo e o perfume): É o Livro do “Génesis” e, a partir daí, outras cosmogonias das religiões abraâmicas, às quais se colam desenvolvimentos dedutivos, numa lógica inflexível e obsoleta, espalhadas ao longo dos textos bíblicos. Por todos, apraz-me sintetizá-los nesta ‘aberrante’ contradição: Assim como Moisés cedeu ao machismo primitivo da sua época,  Paulo Apóstolo, quando decreta solenemente que “o Homem é a cabeça da mulher” (Efésios, 5, 21) deveria completar a sua peregrina alegoria, citando Moisés quando este, afrontosamente, põe O Criador em cena (Génesis, 2, 21-22). Deveria Paulo de Tarso dizer, em rigoroso corolário,  que a “Mulher é a (uma só) costela do homem”.

Quem terá coragem de escrever direito sobre (e contra) estas linhas tortas, que alguém despudoradamente atribuíu  ao Autor Supremo da Justiça Igualitária ?...

O objectivo destes breves considerandos não consiste em doutrinar, muito menos arvorar moralismos conventuais, mas tão-só responder às perguntas com que fechei os dois parágrafos-retro: “Quem porá fim…? Quem terá coragem…?”.

Porque me cansa de tanto ouvir homens ilustres defenderem estoicamente os Direitos da Mulher e da Cidadã, de Olympe de George, desde já 1791, acudiu-me o discurso de Joe Biden, nesta noite: “De que serve perder vidas no Afeganistão se os afegãos pouco ou nada fazem em sua própria defesa?”.

Perdoem-me se exagero. Mas quando se vê a Mulher – são quase todas na Igreja – ufanando-se da sua condição de servas, passivas e subservientes, sem coragem de afirmar a sua verticalidade e o seu direito à palavra (as Mulheres Católicas alemãs já marcaram posição perante o Vaticano!) perante tal indiferentismo generalizado, tem pleno vigor a interpelação de Biden.

Já noutro registo, caí de bruços quando na RTP/M ouvi uma senhora pontassolense de muita idade, nas eleições de 2017, manifestar-se ao jornalista contra uma mulher candidata entre outros homens concorrentes: ”Enquanto houver cabeças, os pés não mandam”. Ridicule, mais charmant! Reflexos directos do “Génesis” e da Carta de Paulo de Tarso. Se fosse erudita, a pobre senhora teria dito que “as costelas não mandam”.

Não esperem as mulheres por advogados-homens (peço desculpa), sejam eles filósofos, teólogos, juristas, actores (actores somos todos!), jornalistas, futebolistas e quejandos. São elas que têm de defender o seu lugar ao sol da vida, na Igreja, na Política, na Ciência, no Trabalho. Apetece inovar a velha palavra de ordem: “Mulheres de todo o mundo, uni-vos”!

Não voltarei a este tema. As mulheres têm talento, energia e criatividade para abrir caminho. Como as Dez Mulheres, de muitas etnias e credos,  com que encimo esta saudação escrita de dentro para fora! Como as encenadoras, directoras e protagonistas dos “SALTOS ALTOS” no Teatro Municipal do Funchal! Bem Hajam!

 

31,Ago/01.Set.21

Martins Júnior

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