segunda-feira, 18 de setembro de 2023

AS LINHAS VERMELHAS DO “PERDÃO”

                                                                               


É do que menos se fala e do que mais o mundo precisa: perdão nas famílias, perdões nas traições, perdões de dívidas entre  devedores e credores da praça, entre Estados, entre governantes e governados, perdões entre gigantes e pigmeus, perdões nas igrejas, perdões místicos, emocionais, de longa ou curta duração.

            Numa época de contrastes – a Lei de Talião, da retaliação primária olho por olho, dente por dente, contra a Economia que mata e a Lei das Amnistias – o elixir de uma Era de Felicidade, o Perdão, merece um aprofundamento analítico tão isento e, ao mesmo tempo, tão seguro que nos faça distinguir os verdadeiros dos falsos perdões.  E, sobretudo,  não nos iludirmos com os doentios perdões pios dos confessionários ou dos mecânicos confiteor  das missas dominicais.

            Como nos restantes processos contratuais, o Perdão é um contrato bilateral: de um lado, o agressor que pede e, do outro, o agredido que concede. O Perdão unilateral e gratuito não cumpre o seu fim essencial nem produz o fruto a que está predestinado. Pode alguém perdoar a outrem sem que este lho peça nem disso se lembre. Pode perdoar por insensibilidade, por orgulho e até desprezo pelo agressor, segundo o velho aforismo: A mim não ofende quem quer. É frustre esse perdão porque simplesmente não envolveu o mínimo contributo do agressor. Dar-lhe-á até mais ganas de repetir as agressões.

            O Perdão autêntico tem um preço!

            Tudo quanto trago escrito serve de introdução ao texto que o LIVRO nos oferece neste domingo e que ilumina não só a semana inteira mas toda a vida, toda a história. Convém consultar a narrativa de Mateus, capítulo 18, 21-35 e logo veremos o preço do Perdão.

Um assalariado contraiu um volumoso empréstimo com o patrão e, não tendo com que pagar, apresentou-se com mulher e filhos aos pés do credor, impetrando-lhe amargurado o perdão da dívida ou o pagamento faseado. Comovido, o patrão perdoou-lhe na totalidade. No dia seguinte soube que o mesmo servo, ao sair do solar do generoso amo, encontrou um colega de trabalho que lhe devia uma irrisória quantia, nada comparável com a que lhe tinha sido perdoada. Agarrou-o, quase o sufocava, e exigiu-lhe o pagamento imediato. Ao tomar conhecimento do caso, o patrão-credor chamou-o e publicamente revogou o perdão anterior, mandou-o para a cadeia, mulher e filhos, até que saldasse toda a dívida.

A medida que usares para medir os outros será com essa mesma medida que tu serás medido também – disse um dia o Mestre do Perdão. Não façamos do nosso Mestre um derrotado, inerte numa cruz ou um buda bonacheirão que se diverte a emitír borlas semanais a burlões profissionais ou a meliantes sacristas de mãos para o céu. Ele perdoa, mas exige. Tal como no Direito dos humanos, a pena para ser ressocializadora integra na sua génese uma exigência factual que lhe corresponda.

O verdadeiro Perdão tem um preço! A introspecção da culpa, o pedido do infractor e o ressarcimento do erro. O resto é ficção Com que o povo néscio se engana!... Perdoe-me Luis Vaz de Camões o plagiato – casual mas coincidente.

 

17-18.Set.23

Martins Júnior

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