Lá vem a Nau Catrineta
Outra história vai contar
Dentro dela uma opereta
Desafia o alto mar
À proa vai a vedeta
Põe tudo a cacarejar
Maravilha da Madeira
Chama-se a Nau Capoeira
A vedeta é uma pombinha
Sem orgasmo nem paixão
Inocente e maneirinha
Cabe na palma da mão
Ela sabe coitadinha
Que à popa vai o pavão
Tão astuto e tão bacano
Que ao leme toca piano
Ele toca, ela comanda
Ele canta, ela ameaça
Se alguma tranca desanda
Pianista perde a graça
E a menina do panda
Manda tudo prá desgraça
Ó pombinha do Divino
Vê lá não percas o tino!
A nau assim se acostuma
Neste estranho solidó
De dia sopra-lhe a espuma
De noite sobra-lhe o pó
Porque a batuta é só uma
E o maestro um fala-só
Mas há quem fuja do tom
E esqueça o Michel Dom
Capoeira na Travessa
E já aumenta o brouhaha
Do porão sai uma peça:
Rua com ménage à
trois!
Os que chegaram à pressa
Não têm direito a estar cá !
E o leme levanta o dedo:
“A mim ninguém mete medo”
Que é isto? – gritou um velho
Que infernal este banzéu
Tem as garras de francelho
Feiticeiro do Ilhéu
O bico ficou vermelho
E debaixo do chapéu
Como Velho do Restelo
Soltou um tremendo apelo:
“Quem é este galinheiro
Roçando aqui ao meu pé
Cacarejo tão rafeiro
Nem na arca de Noé
Os que já estão no poleiro
Não maltratem a bebé !
Se seguem nesse vexame
Vai ao fundo o cavername
“Marinhagem anda à toa
Quem devia ir à popa
Bem galante vai na proa
Ao da ré falta-lhe um tropa
Chama a armada de
Lisboa
E atrás de montespretos
Vêm rochedos e tropedos
“Não tinhas medo, mas tens,
Diz o bruxo ao pianista
Não te dou os parabéns
Trocaste a estirpe tourista
Por uma de três vinténs
Sai mais barata a alpista
Mas não sabes ao que vens
Quem quer papinhos de penas
Há-de tê-las às centenas
“Vão-se já daqui embora
Afastem-se de ao pé de mim
Vão p’ràs ilhas Bora Bora
Com esse enorme chinfrim
E se alguém for borda fora
Deixai-o em Arguim
Se agora a coisa está feia
Que não será na Assembleia”.
Assim falou
O Feiticeiro-avô
E com o enguiço
Pôs-lhe o feitiço
Lá
foi a Nau Capoeira
Desapontou
ao ilhéu
Quando
voltar à Madeira
Já cá tem um mausoléu
No
galináceo vapor
Há
preces, velas, incenso:
Que
morra o Adamastor
Da
Ponta de São Lourenço
Entre
Setembro e Outubro
Outra
história vai rodando
Madeira
ficou ao rubro
Só
não se sabe até quando
29.Set-3-5.Out.23
Martins
Júnior
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