quarta-feira, 1 de abril de 2020

SONHO DE UMA NOITE DE 1º DE ABRIL


                                                  

O mostrengo intangível de onze cabeças e mil braços disformes amarou durante a noite e cercou toda a falésia da ilha, praias e baías. Dado o primeiro alarme no agitar das ondas, as populações amotinadas abandonam as casas e correm desabridamente a defender toda a orla marítima.
         De repente alguém, semelhável a espirito tutelar,  toca a rebate e uma voz cortante fez-se ouvir no intimo de cada ilhéu: “ Para casa! Voltar para casa!! Ficar em casa!!!”. A multidão calou o medo, rumou cada qual ao seu lugar, rodou as chaves de todas as portas, aguardando expectante a palavra de ordem. Horas, minutos, segundos de ansiedade palpitante.
         Antes que a manhã abrisse o mágico pregão soltou-se: “Cantai a plenos pulmões, Tocai trombetas, Rufai tambores, até que o mostrengo abale!”.
         Abriram-se portas e janelas, encheram-se as varandas e um coro colossal – fundo de guerra e melodia de paz – baloiçou a ilha, toda ela nova nau das Descobertas. De repente o mar bramiu e ao longe ouviu-se o marulhar das ondas bravias. Era o mostrengo em fuga, para nunca mais voltar.
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         Eu sei que ao acordar na manhã do dois de Abril, todo o sonho se desfez... Mas o que não se perderá nunca  e há-de  permanecer sempre  no íntimo de cada ilhéu é a voz cortante do mensageiro tutelar: “Ficai em casa, que o monstro desaparecerá!!!”.

01.Abr.2020
Martins Júnior

1 comentário:

  1. Sim, Pe. Martins. Nessa manhã que tarda a chegar, aguardo expectante o marulhar dessas ondas bravias no tímido adeus a esse tremendo exército invisível. E as crianças, até agora acorrentadas ao basalto da Ilha soltar-se-ão dos seus medos e da pedagogia do dever cumprido "fica em casa".

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