terça-feira, 21 de abril de 2020

UNIVERSIDADE EM CASA NUMA ESCOLA GLOBAL


                                                            

           Não sei que outros nomes dar-se-iam a este nova-velha arquitectura da escola. Digo “velha” porque ela viveu tempos áureos há cerca de meio século – a então inovadora e, por isso, novíssima Telescola -  e agora reincarnou, trazida pela aragem do malfadado 'insecto' coronovírico.
         Ela aí está. E já navega, desde ontem, ancorando em cada minúsculo ilhéu habitado da nossa Região, fazendo de cada casa uma escola local dentro da grande escola global. À maneira dos sábios marinheiros, velhos lobos do mar, que têm o “engenho e a arte” de transformar os ventos contrários em força motriz para levar a nau a bom porto, assim também faremos a magia e o talento de captar este aparente retrocesso do modelo escolar e transformá-lo em reserva de ouro, ainda por explorar, no tocante a valores pedagógicos e civilizacionais.
         Em andamento breve, peço para nos acompanharmos neste percurso exploratório, tentando descobrir tesouros escondidos neste imprevisto ‘presente forçado’ do ensino à distância. Uma escola fora da escola! Não obstante todos os  constrangimentos (e são muitos) do novo modelo, há que olhar, com olhos-de-ver, para desfrutarmos daquilo que não se vê.
         Comecemos pelas respostas que os alunos têm dado aos jornalistas que os entrevistaram neste primeiro dia de aulas. A nota mais impressiva que lhes ouvimos, e sempre repetida foi, sem mais rodeios: “Sentimos que temos mais AUTONOMIA”!  Relevo-o em maiúsculas este vocábulo, porque  na boca de jovens e adolescentes, ele tem uma força maior, equiparável às outras autonomias constitucionais tão badaladas nos corredores do poder. Ganhar Autonomia no estudo e, sobremaneira, numa idade de crescimento, significa a assunção de valores e perspectivas conducentes à construção do futuro. Significa interiorizar a sede do “Saber, do Aprender, do Fazer, do Ser”, como afirmou um dia Jacques Delors, a propósito da actividade escolar. Daí nasce o auto-domínio, fruto de uma exigência pessoal, intrínseca. É como que um ‘estágio’ do que mais tarde será o modelo universitário, em que o aluno estará entregue a si mesmo. Parabéns, adolescentes e jovens, pela vossa Autonomia!
         Pego nas palavras daquele que foi o grande timoneiro da União Europeia – “Saber, Aprender, Fazer, enfim, Ser” – para descobrir uma outra jóia escondida no novo processo de aprendizagem, a qual consiste em proporcionar ao “aprendiz da vida” um ambiente ecológico em que ele cresça, natural e harmonicamente, munindo-se das ferramentas indispensáveis a uma boa entrada na grande sociedade.
Sem dar total crédito a Jean Jacques Rousseau – “O homem nasce bom, a sociedade é que o corrompe” – não restam dúvidas que é no seio familiar que se moldam originariamente o futuro homem e a futura mulher. Em síntese, refiro-me à necessária osmose entre educação e instrução, a omnipotente união entre Família e Escola. Suponho não ofender ninguém se trouxer aqui à colação uma das muitas causas do insucesso escolar: o divórcio entre Pais e Professores, entre Família e Escola. Tantas e muitas outras vezes, temos ouvido, em forma de labéu acusatório, que “a escola não pode ser vista como um depósito de crianças e jovens”. Horrível e nauseabunda expressão: Depósito!... De objectos, de embrulhos, de encomendas postais. E depois, os professores que se aguentem!...
Ora, é precisamente na conjuntura actual que eu vejo uma oportunidade de ouro, para que os pais em casa vejam, repito, “com olhos-de-ver”, a massa de que o seu filho e a sua filha se alimentam na quase totalidade do dia, desde que partem, manhã cedo,  para a escola. Mesmo que não consigam acompanhar os conteúdos e os programas escolares, a sua presença é a de um anjo tutelar (não um espião em riste), mas um polo aglutinador e inspirador da educação-instrução, o binómio galvanizador de um jovem, candidato ao mundo de amanhã.
É manifesto que a componente social fará parte integrante da personalidade do aluno e, daí, a convivialidade resultante da aprendizagem colectiva no meio escolar. Por isso que o ensino-à-distância será transitório. Mas enquanto durar, saibam os intervenientes recolher e estimar a “nata” destes dias que ficarão inesquecíveis na sua memória. Só se dá valor àquilo que se perde. Os alunos já terão certamente saudades da sua escola, da sua Professora. Esta tê-las-á dos seus alunos. Simultaneamente, a falta que faz uma mãe na sala de aulas ou um pai no pátio do recreio e nas horas livres…
Faço votos que este tempo novo se traduza numa verdadeira “Universitas”  do Saber, do Aprender, do Fazer e, sobretudo, do Seruma época histórica da Universidade da Vida!

21.Abr.20
Martins Júnior               

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