Aconteceu.
Em termos fácticos, é
essa a leitura directa do anátema do imperador do Capitólio de Washington D.C.
contra o inquilino do Capitólio do Vaticano: “Meta-se nas coisas da Igreja e
deixe de falar nos imigrantes, que isso é comigo”. Por fatalidade de momento - a pneumonia
bilateral - calou-se o Papa Francisco.
Mas há outra leitura, mais
funda e dramática, do mesmo facto.
Para entendê-la, é
preciso recorrer a um evento recente num dos palácios de Sintra, Portugal,
acontecimento tão marcante na essência quanto silenciado, quase clandestino no fórum
dos media. Conta-se em meia dúzia de vocábulos comuns a tantos outros
episódios do quotidiano: Num dos palacetes de Sintra reuniram-se bispos e
cardeais da Igreja Católica, em número de 80 (oitenta). Entrevistado o
Cardeal Patriarca de Lisboa, respondeu não ter sido consultado nem convidado
para este ‘mini-conclave’.
Pelos corredores dos
arciprestados e da CEF (Conferência Episcopal Portuguesa), vagueia um murmúrio sibilino,
equivalente a um comentário enigmático: Esses
80 dignitários eclesiásticos pertencem à ala mais conservadora da Igreja, portanto,
opositora da pastoral renovadora de Francisco Papa. O seu antecessor, Bento
XVI, não conseguiu aguentar o vendaval cardinalício da velha trupe
romana, à qual atribuiu o contundente qualificativo de “abutres do Vaticano”.
Mais resiliente e audaz tem sido Jorge Bergoglio, numa guerra surda, armadilhada
pela ala conservadora, de que fazem parte os Oitenta, reunidos em
Sintra.
Outro facto, também
recente:
Nesta luta acirrada anti-Francisco
arrogou-se, como cerra-fila do batalhão, o ‘pontífice’ da máfia pseudo-cristã que,
lá no paiol dourado de Washington, vocifera e atira à cara do defensor dos pobres refugiados a
bomba-rolha mais obscena, atentatória da missão de um verdadeiro mensageiro
evangélico: Meta-se o Papa nas coisas da Igreja e deixe da mão os imigrantes,
esse assunto é comigo.
Para quem navega na
dúvida persistente, aí tem de contornos bem definidos a dialéctica em que se debate,
desde há dezassete séculos, a instituição Igreja: Para uns, Ela é mais um reino
deste mundo, erguendo--se o Papa como Monarca Imperador. Para outros, a Igreja
não é “um reino deste mundo”, como respondeu Jesus no tribunal de Pôncio
Pilatos. E, por coerência necessária, o Papa é o Servus servorum Dei, o
Servo dos servos de Deus. Para aqueles, o assento do Papa é um trono, ao lado de
Trump, Putin, Netanyahou. Para estes, o
lugar do Papa é a cruz, onde estão os marginalizados, os excluídos, os
migrantes, os oprimidos, os quais o Papa quer tirá-los dessa cruz onde estão
crucificados.
A que Igreja e a que Papa (ou a que cardeais,
bispos, padres) pertencem os crentes, os cristãos?... E fiquem com este
pré-aviso: o rei—-sombra dos EUA, Elon Musk, anda a rondar, a serpentear, os
cardeais eleitores para entronizarem no Capitólio Romano um Papa à medida do
Capitólio de Washington D.C..
Mais que a pré-agonia
física é essa a agonia mais profunda de Francisco, o Incompreendido Sósia do
Nazareno, intérprete fidedigno da vida e da palavra de Jesus, o crucificado
pelos sumos-sacerdotes do Templo de Jerusalém. Quem lhe há-de suceder?
Respondam os crentes. São
estes, os súbditos, os “servos”, os cristãos de base a única força espiritual
que pode fazer a Igreja regressar às fontes originárias do Evangelho. Sendo o
mais forte, o Papa será sempre o elo mais fraco. A palavra de ordem, pois, é uma evidência: a militância e a coerência,
não de Oitenta, mas de muitos, de todos os Milhões de autênticos católicos cristãos!
Assunto sério - de ontem,
de hoje e de sempre.
21-23.Fev.25
Martins Júnior
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