quarta-feira, 4 de dezembro de 2019

“SENHORA PEREGRINA”



Ei-la que vem sobre “as salsas águas”, formosa e segura, ardente mas serena, qual ninfa de um Tejo novo acenando às novas gerações. Argonauta-Mulher, Senhora e Mendiga da terra, do mar e do ar, ela não vem só. Com apenas 16 dos verdes anos, não conseguiu acumular força e poder, capazes de mover o planeta. O poder que ela detém não é dela, mas de quem lho deu. E quem lho deu foi a consciência universal imanente em cada inquilino desta “Casa Comum”. Foi a ciência, mãe e pedagoga do crescimento humano. Enfim, foi a voz da Terra, esse Império dos Três Reinos, que nos foi dado de empréstimo e do qual tantas vezes nos jogamos fora.
            Digam o que queiram os detractores a soldo do negacionismo profissional, essa menina irrompeu, qual Joana d’Arc dos tempos hodiernos, por entre o tropel dos  invasores do planeta e veio desbravando espessos negrumes, tenebrosos mares de opulentos adamastores, eles mesmos estranguladores da vida que a todos pertence. Merece, pois, esta Senhora Peregrina todo o apreço e, mais que o apreço dela, merece que lhe oiçamos o apelo lancinante em defesa do Futuro. De passagem, hoje, por Lisboa, deu a Portugal aquele “clic” que nos enobrece, sim, mas sobretudo nos alerta e põe em marcha.
            Promissora geração esta que lidera o Dia Novo!
            No entanto, se algum espinho se aninha, remordendo,  lá no fundo de mim mesmo, é  aquele que Jean Jacques Rousseau já expressara, com fatal determinismo: “O homem nasce bom,  a sociedade é que o corrompe”. Digamos que Greta Thunberg é uma criança e são crianças as multidões que militantemente a acompanham. Crescerão, serão jovens, adultos. O chamado “mundo do trabalho” será o seu trunfo e o seu troféu, será ainda o seu pão e o seu abrigo. Os Donos do Trabalho, os benfazejos “dadores de trabalho” far-lhes-ão negaças e benesses: “Vens para a administração da minha empresa, da minha siderurgia, dar-te-ei garantias seguras nas minhas oficinas de armamento, abrirás a bom preço sucursais das minhas petrolíferas, ganharás o suficiente para não te preocupares com  esses efeitos de estufa. Tens o futuro nas mãos, o futuro, o capital, enfim, tens tudo a ganhar”, etc., etc..
            E temo que este cantar das sereias do harém dos adamastores sem escrúpulos, destruidores da vida, alicie os jovens que hoje juram corpo e alma pelo ambiente, contra as alterações climáticas… e se pervertam em anestesiados e, depois, entusiásticos aliados dos estranguladores do planeta. O capital, o poder, a ganância dos “Donos Disto Tudo” não têm limites. E a ‘necessidade obriga’…
            Tenho conhecido – e o público também – casos flagrantes de “estadistas”,  inicialmente incondicionais militantes das extremas-esquerdas, revolucionários incorrigíveis,  que mais tarde acabaram nos engordorados braços das direitas e garimparam até ao éden dos “GoldmenSachs”… Enfim, o anátema latino : “Corrutio optimi, pessimi”.
            Faço meu o apelo de Greta Thunberg e acrescento-lhe um voto: Que dos jovens que a seguram nenhum deles confirme o axioma de Rousseau. Para ela, a autêntica Senhora Peregrina dos tempos novos, canto-lhe o fado da paixão  e da coragem, bem português: “Que nunca a voz lhe doa”!
            03.Dez.19
            Martins Júnior
                 
           
           

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