Desde logo, cá vai um pré-aviso: qualquer semelhança é pura coincidência. Para desanuviar o ambiente carregado destas últimas semanas, polvilhadas e encharcadas de comentadores e analistas, tipo “gato escondido com rabo de fora”, venho propor-vos um jogo, em forma de charada, para no fim chegarmos à “moral da história” : saberá algum de vós ligar ou desligar os caracteres deste título “VOZ DA MADEIRA”?... Quem descobrir merece um prémio. E que prémio!!! A sabedoria da história, o guião seguro para saber distinguir entre a aparência e a realidade. Com a minha provecta idade, confesso que só o descobri nos arquivos locais e regionais, a propósito da pesquisa que ando a fazer sobre os conteúdos desse pomposo folclore que deu pelo nome de “Os 500 anos da Diocese”. Procurava eu os hipotéticos “400 anos” (1914) em diversos documentos da época, quando me cai debaixo dos olhos o título “VOZ DA MADEIRA”, mensário publicado entre 1901 e 1927. Disse logo com os meus botões: “Que seca! Só me faltava esta, começar por aturar, já em 1914, o jornal do regime!”
Para os mais novos, talvez não saibam, mas a minha geração sabe que “VOZ DA MADEIRA” cheira ao bolor do fascismo, aos códigos da Inquisição, como veremos mais abaixo. De imediato, vi que não poderia corresponder ao meu palpite, pois seria um grosseiro anacronismo. Então, que era e quem representava essa folha informativa e, sobretudo, eminentemente formativa? Nem mais nem menos que o órgão oficial da Igreja Metodista (Luterana) da Madeira, uma organização religiosa, dirigida por ingleses protestantes radicados na ilha. Devo dizer que fiquei positivamente pasmado com os conteúdos, tanto sobre o debate religioso, como na área social e cultural, com escolas, assistência médica, educação cívica para o povo rural. Dois polos dinâmicos da Igreja Metodista estavam implantados no Santo da Serra e em Machico, sítio da Ribeira Grande e Maroços. Era o que hoje se pode chamar uma publicação progressista, reivindicativa, servindo de exemplo a necessidade de iluminação pública (artesanal) e a construção de fontenários de água potável para a população de Machico, exigidos à Câmara Municipal, em 1926. À margem do texto, repare-se que datam de 1927-28-29 certos fontenários, artisticamente concebidos, que permaneceram até aos dias de hoje.
Eis a primeira versão da “VOZ DA MADEIRA”, para mim, um curioso e precioso achado, pelo seu conteúdo, mas especialmente porque me levou a compará-la com a versão do meu tempo.
E que versão era esta, iniciada em 1953 e extinta 1974? Pela data da sua extinção, talvez cheguemos lá. Esta “moderna” edição da “VOZ DA MADEIRA” era, imaginem, o órgão oficial do regime salazarista, dirigido no mais aceso da agressão fascista, pelo Dr. Agostinho Cardoso, presidente representante da União Nacional (o Partido Único) e onde repetidamente escrevia seu sobrinho, o ex-futuro inquilino da Quinta Vigia, tecendo glórias a Salazar e Caetano, incentivando os jovens soldados a combaterem na guerra colonial, por amor à Pátria (mas a pátria do dito escriba ficou-se pela secretaria do quartel general na Madeira). Chegou o “25 de Abril” e a “VOZ DA MADEIRA” fascista morreu de susto.
Para que servem estas linhas?... Certamente já está tudo esclarecido: Cuidado com as aparências, com as apropriações falaciosas. Não basta o cabeçalho de um jornal para classifica-lo: é preciso saber o seu director, o seu proprietário, a sua tendência oculta, mesmo que se autoproclame independente. E quem diz de um jornal, diz-se de tudo o mais. Para acabar, moral da história: “Nem tudo o que luz é ouro”.
Aproveito para desejar o melhor sucesso à novíssima “VOZ DA MADEIRA”, edição on-line.
25.Nov.14
Martins Júnior
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