Foi o que se deu ontem, dia 2, o qual, sendo par, fez-se “dia ímpar”, tomando esta adjectivação na sua dimensão semântica mais ampla. E de tal forma que hoje, já no sentido numérico do termo, ocupo o habitual dia ímpar com a feliz notícia ontem acontecida: o abraço, em Lisboa, de duas mensagens gémeas: a de Machico, Madeira, com a de Coimbra, Setúbal e Lisboa, conjuntamente na sede da delegação da “AJA - Associação José Afonso”, Rua de São Bento, 170. Cito apenas estas cidades, mas poderia citar muitas outras vilas e aldeias, por onde o imorredoiro “Zeca Afonso” deixou bem impressas as suas pegadas.
Após a apresentação no Teatro Municipal do Funchal e no Solar do Ribeirinho em Machico, surgiu a iniciativa de levar a mesma ideia até ao continente português mostrando páginas sonoras da história da comunidade da Ribeira Seca, especialmente o último “Cancioneiro Breve” e respectivo CD intitulado “A IGREJA É DO POVO , O POVO É DE DEUS” que se completa com o refrão:
“Queremos a Igreja sempre ao nosso lado
Como Deus viveu com o povo explorado”
E tal como reconheceu o próprio presidente da AJA, Francisco Fanhais, foi este o meio ecológico perfeito para fazer emergir na capital a voz de um povo que, nas mesmas pegadas de “Zeca Afonso”, lutou e continua a lutar e a afirmar o seu direito à dignidade e à cidadania inteira, não pela violência mas pela arte, poesia, música e dança. Num ambiente minado pela mesma energia anímica que a todos tocava, projectaram-se no palco as imagens da coreografia com que os jovens interpretam na sua terra a história da suas gentes. Foi visivelmente emocionante constatar o interesse a identificação dos presentes com os conteúdos transmitidos na tela.
Os depoimentos calorosos de duas testemunhas oculares da nossa história local --- Fanhais e Frei Bento Domingues, que viveram “ao vivo” momentos altos da Ribeira Seca --- encheram-nos de um conforto e de uma alegria tamanha. Aliás, foi Bento Domingues que fez a gentileza de apresentar o nosso trabalho. E fê-lo com a profundidade analítica que se lhe reconhece nos livros e nas crónicas semanais do “Público”. Mas o mais sensível para nós foi a manifestação de proximidade que estabeleceu entre a mensagem do nosso “CD-Cancioneiro” e a abertura do Papa Francisco ao mundo, citando uma página inteira do último livro das homilias do Papa em Santa Marta, onde reprova o legalismo que mata e exalta o sentido profético, dinamizador, da Palavra e da Vida.
Surpreendente notícia que nos trouxe Francisco Fanhais foi a indizível alegria que sentiu, nessa mesma tarde, na sede nacional da AJA, em Setúbal, quando recebeu em mão o original, escrito pelo próprio punho de Zeca Afonso, em 1975, daquela canção “Os Índios da Meia-Praia” que fez parte da banda sonora do filme “Continuar a Viver” de António Cunha Telles. Preciosíssima descoberta e feliz coincidência no mesmo dia da nossa presença em “casa” de Zeca Afonso!
Tendo por fundo o mural pintado, em 2013, na Ribeira Seca, pelo artista continental António Alves, (e que reproduz nesta página) encerrou-se este encontro histórico, com a proposta mutuamente sugerida de criar-se na Madeira uma extensão da AJA, constatando que entre nós ela já existe no pensamento e na acção, faltando-he apenas a existência formal, com os respectivos sócios e estatutos.
Aqui fica, para quem ler esta auspiciosa notícia, o convite para que se junte à grande família “Zeca Afonso”, aquele que, abraçado lado a lado à estátua de Trisão Vaz Teixeira, encheu o centro da cidade com a sua e nossa “Grândola, Vila Morena”!
3,Dez,14
Martins Júnior
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