Nesta encosta fria e
chuvosa em que nos é dado viver aquecem-nos as notícias, quase todas
contrastantes e concorrentes, aquecem-nos as passadas agitadas na lufa-lufa de
encher a arca e o presépio. Por isso, escasseia o tempo de ler e comunicar. No
entanto é de notícias, fruta da época, que trago a ementa da noite.. Refiro-me
aos rituais, todos vestidos à moda de cada terra --- as missas do parto --- todas
respeitáveis, se coerentes com o meio em que nascem. Felizmente, aqui em
Machico-cidade deixámos de ouvir, á nossa beira, os estouros dos foguetes às 5,30 da
madrugada, um costume, embora atávico na Madeira, mas absolutamente
contra-natura natalícia.
Pela minha parte,
partilho convosco o estilo que optámos seguir neste modesto, mas verdadeiro,
templo da Ribeira-Seca, Lapinha-Mãe de um povo suburbano. Desde há algumas décadas,
procurámos unir a tradição à inovação: a tradição, nas canções históricas que
desde criança ouvira eu próprio de pais, avós e bisavós, sem alterar as variantes locais, nem na letra nem na
música: tem sempre um sabor a frescura e
a saudade encher as paredes do templo e as pregas da alma com sonoridades que vêm
das colinas do passado. A inovação está nas temáticas escolhidas para as nove
manhãs, entre 16 e 24 de Dezembro de cada ano. Cedo me apercebi que as pessoas
trazem no seu íntimo um projecto ou promessa ou pendor: não faltar a nenhuma
Missa do Parto, faça frio ou chuva ou vento e, daí, entendi oferecer um só tema
para reflexão dos participantes, tema esse que, sendo único, se desdobra em
muitas das suas vertentes, uma espécie de mini-curso intensivo, cirúrgico, que
marcasse de forma impressiva o fundo cultural e religioso de quem faz tamanho
sacrifício.
Muitos e diversificados
foram esses temas, entre os quais, as figuras que antes e depois de Cristo
tornaram presentes o seu nascimento e a sua mensagem, figuras como Moisés,
Isaías, João Baptista, os primitivos mártires,
Joana d’Arc, António Vieira, Mahatma Gandhi, Luther King. Teresa de
Calcutá, Zeca Afonso e tantos outros. Noutro ano, escolhemos o estudo das diferentes
religiões; noutro, as oscilações
climáticas e o dever de respeitar a natureza criada; noutro, os povos e continentes, irmanados no
mesmo abraço; noutro, ainda, a
simbologia física e psicológica das cores, aliadas à saúde e à beleza, etc.,
sendo todos os presépios inspirados nas respectivas temáticas.
Este ano, coincidindo com
o 78º aniversário de Francisco Papa, estamos envolvidos na “Alegria do
Evangelho” (Evangelii Gaudium), a sua
Magna Carta para o mundo. O propósito é colocar nas mãos das pessoas o texto
integral, lido por um dos presentes,
consoante o seu dia. Será o nosso presépio gigante inspirado na figura de Bergoglio
abraçando o globo terrestre, todo ele composto de centenas, milhares de pinhas
das nossas montanhas, trazidas pelas mãos de homens e mulheres desta comunidade.
O fundamental é que não se faça do Natal apenas um folhetim folclórico,
recheado de broas e licores com que (também
nós!) confraternizamos descontraidamente, despicando ao desafio, no adro da
nossa igreja, após a cerimónia litúrgica. É preciso que o Natal/2014 não seja
só na hora, mas faça história dentro de
nós pelo clarão de uma ideia que perdure.
Quem vier, venha por bem. Porque aqui mora a “Alegria do Evangelho”, a alegria branca do
abraço universal!
19.Dez.14
Martins Júnior
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