segunda-feira, 11 de fevereiro de 2019

VIAGEM TRIANGULAR AO REDOR DE UM DIA


                                                   

Quem, por simpática deferência, me acompanha no trilho dos dias ímpares não esperará certamente contínuas doses compactas ou esboços de teses pré-elaboradas. Por isso, hoje preferi deambular à volta do 11 de Fevereiro, com o mesmo  à-vontade com que Xavier de Maistre, em 1794,  escreveu a Viagem à Volta do Meu Quarto.
         Cada dia traz a sua graça e sua estatura singular. Preciso é vê-las à nossa beira, na palma da nossa mão, embutidas dentro do mais íntimo de nós mesmos. Como a poesia que nos veste a toda a hora e nem sempre damos por ela.
Talvez levado pela reminiscência do eminente filósofo René Descartes que antes de morrer, precisamente em 11 de Fevereiro de 1650, nos deixou em testamento o famoso legado Cogito ergo Sum (Penso, logo Existo), talvez por isso encontrei neste 11 de Fevereiro o triângulo existencial em que todo o ser humano se movimenta. Nós também.
É hoje que em todo o mundo se presta atenção a quem está privado do precioso bem da saúde. É o Dia Mundial do Doente. Hoje, também,  a crença mariana, a partir da gruta de Lourdes, em França, desde 11 de Fevereiro de 1858, conhece a apoteose de um acontecimento cultuado e revisitado anualmente por 5 milhões de crentes de 140 países. Finalmente, é hoje que no Irão foi derrubado o regime de Reza Palevi e instaurada a República Islâmica, palco de tumultos e desavenças. Foi  em 11 de Fevereiro de 1979. Há 40 anos.
Doença. Crença. Desavença.
Basta assentar a cabeça no tripé cartesiano e logo concluímos que ‘todo o homem que vem a este mundo’ nasce num berço triangular onde infalivelmente cabem aquelas três dimensões. O segredo do sucesso está em, primeiro aceitá-las; depois transformá-las e, por fim, sublimá-las. Portadores natos da saúde (descontado o deficiente património hereditário) somos candidatos directamente eleitos à Doença. Encará-la frontalmente e acreditar na superação da mesma, pela ciência, pela motivação, pelo optimismo! Este é, a meu ver, o conteúdo mais eficaz de toda a Crença. Há quem prefira lançar-se no abismo a que chamamos fé, endossando para factores supraterrestres expectativas que, com esforço, por vezes titânico, dependeriam de nós. Será, porventura, uma opção in extremis, mas que na sua raiz terá de contar sempre com um suplemento volitivo inexcedível da nossa parte, ou seja, “esperar contra toda a esperança”.   
    Se a Doença é um conflito orgânico connosco próprios, outros embates mais densos advêm e arregimentam-se fora de nós. É então o reino da Desavença. Por muito que se a queira evitar, ela tentará infiltrar-se, per faz et per nefas, em tradução popular, por ter cão e por não ter cão. Nesta arena, só ganha quem enfrenta o obstáculo com a mesma perícia do hábil velejador que até sabe captar  o vento contrário para alcançar a meta vitoriosa. Tão difícil a arte de marear, quão sábia e generosa a ciência de dirimir conflitos! Referindo-se ao Irão, o jornalista de Le Monde, Louis Imbert, fala em caso de “revolução interminável” e conclui, em jeito de lamento: “Em 11 de Fevereiro, o país celebra os 40 anos da revolução que lhe outorgou a República Islâmica, mas devido às sanções americanas, o Irão não tem o coração na festa”. Até um dia!
                                                    

Dia esse que surgiu para Nelson Mandela. Foi também em 11 de Fevereiro. Ano 1990. Após 27 anos preso na cadeia de Victor Verser, província do Cabo, o Grande Lutador-Pacificador sai em liberdade para transformar a Doença em Saúde Social, a Crença em Certeza ganha a pulso e a Desavença em Abraço de povos e gerações.
   E com este Abraço final, termina também aqui a Viagem global à volta do 11 de Fevereiro de 2019. Todos os dias têm a sua graça e a sua estatura singular. Como a Poesia!
11.Fev.19
Martins Júnior

Sem comentários:

Enviar um comentário