Quem,
por simpática deferência, me acompanha no trilho dos dias ímpares não esperará
certamente contínuas doses compactas ou esboços de teses pré-elaboradas. Por
isso, hoje preferi deambular à volta do 11 de Fevereiro, com o mesmo à-vontade com que Xavier de Maistre, em 1794, escreveu a Viagem à Volta do Meu Quarto.
Cada dia traz a sua graça e sua
estatura singular. Preciso é vê-las à nossa beira, na palma da nossa mão,
embutidas dentro do mais íntimo de nós mesmos. Como a poesia que nos veste a
toda a hora e nem sempre damos por ela.
Talvez
levado pela reminiscência do eminente filósofo René Descartes que antes de morrer,
precisamente em 11 de Fevereiro de 1650, nos deixou em testamento o famoso
legado Cogito ergo Sum (Penso, logo
Existo), talvez por isso encontrei neste 11 de Fevereiro o triângulo
existencial em que todo o ser humano se movimenta. Nós também.
É
hoje que em todo o mundo se presta atenção a quem está privado do precioso bem
da saúde. É o Dia Mundial do Doente. Hoje, também, a crença mariana, a partir da gruta de
Lourdes, em França, desde 11 de Fevereiro de 1858, conhece a apoteose de um
acontecimento cultuado e revisitado anualmente por 5 milhões de crentes de 140
países. Finalmente, é hoje que no Irão foi derrubado o regime de Reza Palevi e
instaurada a República Islâmica, palco de tumultos e desavenças. Foi em 11 de Fevereiro de 1979. Há 40 anos.
Doença. Crença.
Desavença.
Basta
assentar a cabeça no tripé cartesiano e logo concluímos que ‘todo o homem que
vem a este mundo’ nasce num berço triangular onde infalivelmente cabem aquelas
três dimensões. O segredo do sucesso está em, primeiro aceitá-las; depois
transformá-las e, por fim, sublimá-las. Portadores natos da saúde (descontado o
deficiente património hereditário) somos candidatos directamente eleitos à Doença.
Encará-la frontalmente e acreditar na superação da mesma, pela ciência, pela
motivação, pelo optimismo! Este é, a meu ver, o conteúdo mais eficaz de toda a
Crença. Há quem prefira lançar-se no abismo a que chamamos fé, endossando para
factores supraterrestres expectativas que, com esforço, por vezes titânico,
dependeriam de nós. Será, porventura, uma opção in extremis, mas que na sua raiz terá de contar sempre com um
suplemento volitivo inexcedível da nossa parte, ou seja, “esperar contra toda a
esperança”.
Se a
Doença é um conflito orgânico connosco próprios, outros embates mais densos advêm
e arregimentam-se fora de nós. É então o reino da Desavença. Por muito que se a
queira evitar, ela tentará infiltrar-se, per
faz et per nefas, em tradução popular, por
ter cão e por não ter cão. Nesta arena, só ganha quem enfrenta o obstáculo
com a mesma perícia do hábil velejador que até sabe captar o vento contrário para alcançar a meta
vitoriosa. Tão difícil a arte de marear, quão sábia e generosa a ciência de
dirimir conflitos! Referindo-se ao Irão, o jornalista de Le Monde, Louis Imbert, fala em caso de “revolução interminável” e
conclui, em jeito de lamento: “Em 11 de Fevereiro, o país celebra os 40 anos da
revolução que lhe outorgou a República Islâmica, mas devido às sanções
americanas, o Irão não tem o coração na festa”. Até um dia!
Dia
esse que surgiu para Nelson Mandela. Foi também em 11 de Fevereiro. Ano 1990.
Após 27 anos preso na cadeia de Victor Verser, província do Cabo, o Grande
Lutador-Pacificador sai em liberdade para transformar a Doença em Saúde Social,
a Crença em Certeza ganha a pulso e a Desavença em Abraço de povos e gerações.
E
com este Abraço final, termina também aqui a Viagem global à volta do 11 de
Fevereiro de 2019. Todos os dias têm a sua graça e a sua estatura singular. Como
a Poesia!
11.Fev.19
Martins Júnior
Sem comentários:
Enviar um comentário