Impossível
passar insensível à beira do ‘monstro’. Fazer-lhe ouvidos de mercador é o mesmo
que cair-lhe nas garras e deixar-se sufocar sem poder soltar um pio. O ‘monstro’
de que falo é o Poder Absoluto, de que
tanto tem badalado a opinião pública, a propósito da maioria absoluta saída das
eleições de 30 de Janeiro p.p.. Por isso, optei por dar continuidade às
reflexões do último blog, com particular
acento na responsabilidade do cidadão comum em permanecer vigilante e actuante
face aos primeiros rebentos de qualquer eventual prepotência governativa. Aqui,
é o próprio povo que ministra a receita: “Antes que o mal cresça, corte-se-lhe
a cabeça”.
Se, desde o início da aventura humana
no planeta impera a evidência darwinista – a lei do mais forte ou o poder
absoluto – deve também dizer-se que vem
de muito longe o primado da Liberdade, a defesa de um direito igualitário,
inerente à condição humana, contra o qual nem rei nem deuses conseguem
ultrapassar.
Faz
bem recordar a Magna Carta de 1215, no Reino Unido, precedida da Lei das
Liberdades, de 1100, em que são determinantes, incontornáveis, as linhas
vermelhas impostas pelo Parlamento às tentativas absolutistas dos monarcas: “A
Carta de todo o homem digno em qualquer tempo e em qualquer lugar”, assim classificá-la-ia
mais tarde Winston Churchill. A Carta da Floresta, designada de ‘segunda carta’,
exigia que “ os bens comuns – fonte da subsistência da população geral – fossem
rigorosamente protegidos do poder externo, impondo limites à sua privatização”.
Muita luta sobreveio e muitas foram as
vítimas que deram a vida pela instauração e desenvolvimentos da Magna Carta,
sobressaindo o parlamentar Henry Vane, decapitado em pleno cadafalso, por ter
proclamado desassombradamente (na sequência da famosa ‘Petição de Direitos’) que
“a origem de todo o poder justo está na sociedade civil, não no rei, nem mesmo
em Deus”. Isto em 1628 !... Passaram-se mais de três séculos (348 anos) para
que a Assembleia da República Portuguesa inscrevesse na sua Constituição o
mesmo inalienável normativo: “A soberania reside no povo”.
Interrompo esta viagem no tempo (e tão
bem que ela sabe!) para insistir na estratégia mais eficaz para subtrair, direi
mesmo, minar pela raiz os atávicos instintos do “monstro”-poder absoluto. Para
isso, permitam-me citar um excerto do livro “QUEM GOVERNA O MUNDO?”, de Noam
Chomsky, precisamente porque vem confirmar o que assinalei em escrito anterior.
Chomsky, ‘o maior intelectual da esfera
pública’, perscruta a ‘ânsia de conceber métodos sofisticados de contolo das
atitudes e da opinião pública’, por parte dos EUA em 1960. E afirma sem rodeios:
“Uma
das tarefas primordiais do Comité de Informação Pública dos EUA foi sempre
manter a população longe dos ‘nossos pescoços’… Uma preocupação em
particular tinha que ver com a introdução de melhores mecanismos de controlo
sobre as instituições responsáveis pela doutrinação dos jovens: as escolas,
as universidades, as igrejas que, aos olhos dos líderes políticos, não
estavam a ser capazes de cumprir a tarefa essencial: a exigência de medidas para impor moderação à democracia”.
É isto: a tática mais certeira é atacar
as bases – o povo anónimo, opinião pública, escolas, universidades, igrejas.
Olhem para a Madeira, a já velha ‘Madeira Nova’, e digam se Noam Chomsky não
tem razão…
É do ADN de todo o monstro absoluto nunca dormir. E o
Zé-Povo, os verdadeiros soberanos da Nação, entretêm-se sonâmbulos com as
piruetas do mostrengo, na imprensa subsidiária, nos áudio-visuais, nas festas,
nas benesses. Apetece trautear a canção do velho regime: “Lá vamos cantando e rindo, Lá vamos pagando e rindo”!
Volto a propor: o poder do povo não se
exerce só de quatro em quatro anos, é de todos os anos, de todos os dias, nunca
permitindo que sob o nosso olhar “o sapateiro-mor e seus apaniguados subam
acima da chinela”, como bem observou o famoso Apeles da velha Grécia. Quando um
colega é prejudicado injustamente e nós nos calamos – é o monstro que alimentamos. Quando ficamos “longe dos pescoços dos
poderosos eleitos” e nos julgamos inúteis, impotentes, aí aguçam-se as garras
do “monstro”, cresce o Poder Absoluto. Entendamo-nos: não é o vértice que mexe
a pirâmide (do Poder), são as bases que a sustentam, são as bases que a
removem.
“Quem se cala com o que está torto está
entortando cada vez mais” – dizia-me um sábio ancião dos nossos campos.
Para terminar o rumo reflexivo que não
tem termo, apraz-me aplaudir calorosamente a decisão de um importante sector
representativo da vida económica regional quando hoje fez constar na
comunicação social que pretende intervir, participando presencialmente, na
orientação programática do famigerado Plano de Reestruturação e Resiliência
(leia-se: ‘bazuca europeia’), de que
a Madeira é privilegiada beneficiária.
Esclarecendo: é meu dever, mais que um
direito, estar atento e escrever sobre a paisagem sócio-política, económica e
cultural da terra que foi dada como berço e caminho longo!
09.Fev.2022
Martins
Júnior
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