Que
mau gosto esse para um início de verão! – dirão todos os que virem aqui
reproduzida a primeira página do Charlie Hebdo. E mais estupefactos
ficarão se eu disser que escolhi esta tremenda - mas genial ilustração do cartoonista
do corajoso periódico francês – escolhi-a como fundo de reflexão inspirada no
LIVRO, esse manancial inesgotável que me puxa para os blogues de fim-de-semana.
Há
um denominador comum estre o cartoon de 2023 e o texto de Zacarias
Profeta, do ano 520 A.C. Separam-nos 26 séculos, mas é o mesmo o fio
condutor que os une: a Guerra! Terrivelmente, a Guerra – sempre o mesmo monstro
desumano, degradante! Mas ao mesmo tempo, parece, indissociável e congénito à
condição humana. Aliás, a Bíblia (O LIVRO) a par de estâncias de altíssona ascese,
é também um longo chão coalhado de sangue, escaramuças tribais, violências
domésticas, enfim, despojos de guerra, dos quais os hebreus saíam quase sempre
derrotados, invocando depois a mão poderosa de Deus Ihaveh para vingar os
inimigos, caso do Saalmo 136, entre muitos outros.
Vamos
então ao estranho paralelo: LIVRO-Charlie Hebdo, ou, mais precisamente, o
elo que os liga, a conflitualidade beligerante, que marcou a época de Zacarias
e do rei Dario, no século VI, A.C., e a invasão da Ucrânia pela
Federação Russa, no século XXI. Tudo, para responder-se à dramática questão que
se põe actualmente: Rendição ou Morte. Por outras palavras: quais os caminhos
para a Paz: Resistir ou entregar as armas?!...
O
texto bíblico dar-nos-á pistas e argumentos. Trata-se da alvorada da Paz, após todos os tumultos e batalhas
sangrentas. Surpresa maior é a vitória do mais fraco sobre o mais forte. O
vencedor anunciará a Paz a todas as nações, o seu domínio irá de um Mar ao outro Mar e do Rio até aos
confins da Terra (Zac. 9, 9-
-10).
Vaticinando a futura entrada de Jesus em Jerusalém, em Domingo de Ramos, descreve
a humildade do vencedor nos seguintes termos: Exulta de alegria, filha de
Sião, Eis o teu Rei, justo e salvador, que vem ao teu encontro, humildemente
montado num jumentinho.
Um
sonho cor-de-rosa, instantâneo mágico que fez brotar a oliveira da Paz sobre um
rochedo de basalto impenetrável?!... Pura ilusão! Porque antes da conquista da
Paz, o Profeta explicita, sem sombra de dúvida, a estratégia e a logística para
lá chegar: Guerra, sempre a guerra. Sigamos a narrativa de Zacarias:
Ele,
o vencedor exterminará os carros de guerra de Efraim e os cavalos de
Jerusalém, quebrará todos os arco de guerra… A cidade de Tiro será consumida
pelas chamas, o seu poderio lançado ao mar. Eu destruirei a soberba dos
Filisteus. Farei desaparecer o rei de Gaza… Tirar-lhes-ei da boca o seu sangue e a abominação de entre os seus dentes…
Serei Eu próprio uma sentinela contra os vadios e o tirano não passará, porque
Eu atendi à miséria do Meu povo.
Este
o sudário cruento de séculos do povo hebreu que, por ironia da história,
cantava o Shalom, Shalom, Cidade da Paz,, a canção hierolimitana ainda hoje
propagandeada pela voz de Joshua Aaron. Comparemos os 500 dias de guerra russa
na Ucrânea, ‘carros de combate e cavalos de guerra’ – tanques, drones, mísseis.
A poderosa Jerusalém aproximemo-la do império czarista de Moscovo e o ‘pequeno
e fraco’ Volodymyr Zelensky coloquemo-lo
ao lado do possante tricéfalo Putin--Wagner-Prigozhin. E interroguemo-nos sobre
quais as semelhanças e quais as diferenças. E quais as soluções. De um lado o
assaltante indomável, sem escrúpulos, do outro o espoliado das suas terras e
forçado a abandonar a própria casa.
Apetecível
seria a solução construída por Gandhi, Mandela, ou mesmo a da nossa “Revolução
dos Cravos”, sem derrame de sangue. Aliás, o sangue já vinha sendo
derramado na guerra colonial. Sangue e ossos e vidas sepultas.
Que
fazer, se o ladrão só propõe e aceita a Paz sob condição de continuar com o património,
mais claramente, com os bens e a carteira, que roubou à vítima espoliada?...
Sem
pretender formular tese sobre o princípio clássico: si vis pacem, para
bellum – se queres a paz prepara(-te para) a guerra – trago à colação um
excerto da Alocução de Pio XII, no Natal de 1948, citado pelo teólogo Bernhard
Haring, na sua obra monumental Das Gesetz Christi- A Lei de Cristo – Edit.
Herder, Brasiil, 1950:
Negar,
categórica e incondicionalmente, ao Direito o apoio da força, é permitir que a
força tripudie sobre o Direito, é entregar a Humanidade à mercê de desordem
ainda pior, que é a violência moral.
À
consideração superior. Da nossa
consciência colectiva. Que o horror da gravura em epígrafe suscite o horror aos
monstros autofágicos das estepes russas. Só espero que as reprováveis ‘ bombas de
fragmentação’ nunca sejam utilizadas pela Ucrânea, sirvam apenas de ameaça e
não mais.
“Shalom,
Shalom” - vou, entretanto, ensaiando com Joshua Aaron a almejada Canção da Paz Universal.
09.Jul.23
Martins Júnior
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