Estaria
dispensado quem me lê, porque hoje, sendo ímpar o dia, acaba por ser dia par.
Se em linguagem matemática “menos com menos dá mais”, também aqui se pode
agregar que “ímpar com ímpar dá par”.
E
porque a história do 31 de Janeiro ficaria incompleta sem o 1 de Fevereiro,
eis-me hoje aqui sentado a folhear convosco os anais de um país sempre em
evolução. E componho assim a tríplice gradação do saber: se o último do mês ficaria incompleto sem o
segundo, os dois ficariam vazios sem um
terceiro, o 5 de Outubro. Nestes três patamares desperta desde logo o método
científico: tese – antítese – síntese. O 31 de Janeiro foi a tese, o 1 de Fevereiro a antítese e o 5 de Outubro a síntese. De modo que o 1 de Fevereiro
--- hoje --- surge como a ponte decisiva entre dois pilares. Mas que ponte! Em vez de pedra romana aparelhada --- ossadas
régias. E em vez de agua dos rios --- golfadas
de sangue azul derramado na praça pública. E foram precisos 19 tumultuosos anos para fechar o círculo paradoxal, a um tempo vicioso
e virtuoso.
Decerto que já chegastes à decifração
desta metáfora encadeada. Mas tenho o dever de torná-la transparente. Em 1891, o
31 de Janeiro foi o primeiro clarão da
República a haver, clarão depressa entenebrecido pela prisão, degredo e morte dos que afrontaram a monarquia vigente. Em
1908, 1 de Fevereiro, é assassinado
às portas de Lisboa o símbolo maior do poder absoluto, o rei D. Carlos I,
regressado do Palácio Ducal de Vila Viçosa. O rumo silencioso mas inexorável da
Ideia, como diria Antero de Quental!... Digamos que a tese imperial (os escorraçados de ontem) encontra agora a
sua antítese com a morte do Rei que (como a História se repete!) tinha assinado
no dia anterior a prisão dos novos revoltosos
anti-monárquicos, gente de primeira água, como António José de Almeida, Afonso Costa, Egas Moniz e, entre outros, o visconde da Ribeira Brava.
A ponte, argamassada de sangue real,
deu lugar, dois anos depois, à descoberta e à conquista da outra margem. o 5 de Outubro, a gloriosa metamorfose do
poder de um homem só (que é o que significa Monarquia)
no poder como emanação pública de algo que é bem, coisa, comum, Res Pública. Terríveis tempos esses da
mudança de uma mentalidade secular para
o miradouro de um tempo novo!...
Ficar-me-ei por aqui, deixando para
quando for oportuno (e sê-lo-á sempre
imprescindível) um olhar atento sobre as convulsões sociais, políticas e culturais
que marcaram os primórdios da República. Hoje quis tão-só assinalar o 1 de Fevereiro, neste que é o 108º
aniversário da ponte, sangrenta mas decisiva, construída entre 1891 e 1910.
E porque em 25 de Abril de 1974
redescobriu-se uma Nova República em
Portugal --- a passagem de nível entre a ditadura e a Democracia --- não pode deixar de marcar-se em letras de oiro o processo de transição sem
derramamento de uma só gota de sangue, símbolo do crescimento evolutivo de um
Povo que procura, em cada socalco da caminhada, alcançar o cimo da montanha, a
sua plena realização. Nós somos também desse Povo!
1.Fev.16
Martins
Júnior
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