Fiquei deveras surpreendido com o elevado número de leituras
que mereceu o meu último convívio convosco, não obstante o título que, à
primeira vista, tornava-o antipático e, no mínimo, indigesto. Apreciei as
várias partilhas do texto, os comentários, sobretudo o do Dr. Gaudêncio
Figueira que destacou um parágrafo que, porventura, tenha passado liminarmente
desapercebido, o qual sublinhava o pesado encargo financeiro e logístico que
impenderia sobre Francisco Papa se acaso tivesse o temão governativo de um eventual
país de acolhimento. É verdade, mas também não é menos verdade que, perante a
tradição imperialista do Pontificado Romano, recai sobre os ombros do actual
Pontífice uma hecatombe de insinuações, impropérios e ameaças, vindas dos
quadrantes político-religiosos auto-proclamados defensores acérrimos da pureza
evangélica do “Depósito da Fé” - sofisticado disfarce de um passado faustoso do
empório vaticano. Veja-se o recente duelo verbal de dois cardeais da Cúria
Romana: o cardeal W.Kasper, ao lado de Francisco e, em arrepiante contraste, o
cardeal Gehrard Muller, ainda por cima, coroado como supremo titular do Sagrado
Tribunal da Doutrina da Fé Católica.
Mas, de entre os contundentes aleives que
os detractores do Papa lhe lançam em rosto, o mais capcioso é o de acusá-lo do mais rasteiro populismo. Só
lhes falta apropriar-se abusivamente de
Karl Marx e dizer que o Papa Francisco “é o ópio do povo”. Interroguemo-nos
olhos nos olhos: Será Francisco um Papa populista? … É a questão que, muito
judiciosamente, põe Jorge Bustos , na secção “La Ultima Coluna” de “EL MUNDO”,
contradizendo “a ideologia liberal que o acusa de peronismo jesuítico”.
Reflictamos.
O populismo tem por objectivo
dissimulado a conquista do poder e, daí, a implantação do autoritarismo. Um
outro escritor, Jean-Marie Colomban define que a “estratégia populista alimenta a necessidade de um salvador, a
urgência de um ‘super-herói’ que, uma vez no poder, usa e abusa de todos os
meios belicistas para implantar um regime de ditadura”. Casos não nos faltam,
todos somados no protótipo mais execrável do sargento Hitler que, começando
pelas bases populares, manejou habilmente a ideia patriótica do nacionalismo alemão, até desembocar no monstruoso regime nazi. Comparar o bispo argentino Georgio Bergoglio ao
ditador populista dos fornos crematórios é o mesmo que chamar luz às trevas -- e
às trevas chamar luz. Quem será capaz de encontrar no humilde trato, sensível e
humano, do pré-octogenário Francisco as
tentaculares ambições do domínio temporal de muitos Papas que o antecederam?...
Que ganhou ele com o combate ao sacrílego Banco do Vaticano e toda a chusma de
cardeais e banqueiros que aí lavavam dinheiro sujo?... Que reino pretenderá ele erguer ao tocar com
as próprias mãos as chagas que a “economia que mata” abriu no corpo exangue de
milhões de seres humanos?...
Está nos seus antípodas qualquer
tentação de autoritarismo ou vanglória mundana. Nem sequer o move a
teatralidade congénita de João Paulo II, ídolo das multidões e delas pendente até ao
último suspiro. Tenho para mim que Francisco Papa mais ama a intimidade directa, coração-a-coração, do
que a hipnose colectiva das
manifestações a perder de vista. Ele, sim, o Irmão-Homem dos Afectos, o
apaixonado seduzido pelas periferias, claramente avesso aos protocolos presidenciais dos
poderes do mundo. E se, pontualmente, os aceita, é porque ainda não chegou a
sua hora de renunciar ao Estado do Vaticano. Um dia chegará!
Termino com a mesma conclusão do
articulista citado: “Os que acusam o Papa Francisco de populismo ignoram que
Jesus Cristo protagonizou tantas cenas que poderiam classificar-se de populistas, como curar doentes, multiplicar
pães e peixes…E os que lhe exigem maior rigor teológico esquecem a prioridade
que o Fundador da sua Fé dedicou aos deserdados da terra”.
19.Abri.16
Martins Júnior
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