É
práxis comum designar pelo nome do Autor ou da cidade que lhes deu origem
determinados documentos de relevância capital para a história e para o mundo.
Estão neste elenco a Magna Carta (1215)
de “João Sem Terra”, as Teses de Wittenberg, (1517) o Tratado de Roma (1957), o
de Maastricht (1992) e, mais perto de nós, o de Lisboa (2007). Estes e muitos
outros textos significaram uma viragem decisiva não só no cenário em que foram
produzidos mas, com maior caudal abrangente, nas gerações futuras, seja na
vivência democrática, seja no âmbito estritamente religioso,
Após a leitura de uma entrevista
memorável publicada no “JM”, do Funchal, no dia 9 de Dezembro, não hesito em classificá-la
como o Documento por excelência, a que chamarei de “Manifesto da Madeira” (2017).
É seu Autor, na qualidade de entrevistado, o já largamente conhecido, direi familiar aos
madeirenses, Professor Doutor Padre Anselmo Borges. Pena é que tamanha dimensão
filosófico-teológica e sociológica fique comprimida nos estreitos limites da
ilha. Conforta-nos, no entanto, a certeza de que o seu pensamento já ganhou
foros de cidadania nacional e internacional, através dos muitos livros,
conferências, entrevistas que entraram, por direito próprio, na galeria dos
intelectuais contemporâneos.
Porque esta minha reflexão não tem por
escopo final entronizar Anselmo Borges (nem ele precisa) quero tão-só mergulhar
na profundidade, na coragem e, sobretudo, na visão cósmica, necessariamente
holística, com que aborda as mais vastas questões e, ainda, assinalar a
intuição maiêutica de integrar o leitor nesse largo universo que o olhar
acutilante da jornalista Carla Ribeiro entendeu perscrutar-lhe.
Desde a Constituição, dita Dogmática,
da Igreja, a investigação histórica das suas estruturas e subsequentes desenvolvimentos,
o Direito Canónico, até à evolução gradativa da entidade sociológica do “fenómeno
cristão”, focalizado cirurgicamente no Vaticano e no Papa Francisco, tudo vem
aberto na entrevista, ali está o inventário completo de tudo quanto sobre
Igreja e Religião, Ciência e Fé alguém queira saber, crente ou não crente. E se
acaso houver quem fique perturbado pela transparência corajosa (alguns chamarão
‘escandalosa’) com que ele enfrenta os problemas e denuncia os desvios
hierárquicos, uma evidência se impõe: O seu programa não tem outro horizonte
senão o regresso às origens, às fontes límpidas e suculentas do Evangelho de
Cristo. Tal qual como Francisco Papa, a quem define com esta tão linear quanto
eloquente identidade: “É um Papa cristãos”!
Daí, a sua coragem – fruto de uma
convicção amadurecida e, por vezes, sofrida.
Olhos nos olhos e palavra liberta, nunca dúbia nunca empastelada – eis Anselmo
Borges em tamanho natural. Vi-o e confirmei-o quando, no Festival do Funchal,
foi convidado para apresentar o livro “A Vagina”, da escritora americana Naomi
Wolf. E com que dignidade, eloquência e superioridade o fez, aplaudido por todo
o Teatro!
Por
isso, não se esconde por detrás das cortinas sedosas da hierarquia, antes pelo
contrário, acentua que a “grande preocupação do Papa é converter em cristãos os cardeais e os bispos
que o não são”. E, com a mesma frontalidade, mas cordialmente, observar esta
crua realidade: “Há padres novos que continuam conservadores”. Anselmo Borges
sabe do que fala. E sente a sua responsabilidade como Professor e Educador das
futuras gerações. Não pode titubear nem resvalar para o “crime dos que
silenciam”. É que as religiões assentaram banca e supermercado que terão sempre
clientes à porta. Por rituais atávicos, por medos e superstições, por
interesses inconfessados. Anselmo Borges tem o mandato imperativo de sanear as excrescências e
restaurar a face íntegra da espiritualidade, da vocação transcendental do
Homem. O que Hans Kung e o falecido Cardeal Martini, entre outros grandes
teólogos, representam na Europa e no Mundo, Anselmo Borges e, com ele, Bento
Domingues incarnam em Portugal.
Perdoar-me-á
o facto de ter chamado à sua entrevista “Manifesto”, que bem merecia ser
publicado em volume autónomo. Mas outro
sinónimo não acho para classificar essa profética mensagem, em formato jornalístico –
Manifesto da Madeira - a qual considero um seguro Anteprojecto para uma
verdadeira Constituição da Igreja de Cristo. Na esteira de João Baptista, o
Precursor! Em uníssono com Francisco Papa!
11.Dez.17
Martins Júnior
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