sábado, 9 de dezembro de 2017

MITOS E SOMBRAS À VOLTA DE UMA MULHER, A MAIOR!

                                              
Calculo a sensaboria com que  muitos aceitarão este meu produto de fim de semana. Ou talvez nem o aceitarão, pois que traz um rótulo enfadonho, embora ‘perfumado’ pelo bolor  dos mitos religiosos que se colam inconscientemente aos indivíduos e às sucessivas gerações. Faço-o porque estou entre dois dias feriados e consagrados. Faço-o também porque sei distinguir o que é magia e sonho daquilo que é mito redutor de factos e personalidades. Faço-o, ainda, porque o mito balança entre o 1 e o 8 de Dezembro. Poucos parágrafos bastarão.
         Primeiro: dizem os livros que os conjurados e, com eles, D. João IV atribuíram  à “Senhora da Conceição” o sucesso da ‘Restauração’ de 1640 e, por isso,  consagraram-na ‘Rainha e Padroeira de Portugal”, inclusive com o direito exclusivo de, só ela e não o monarca, passar a usar a coroa do Império. Primeiro mito, herdado já desde 1385 em agradecimento da vitória de Aljubarrota, com a agravante herética de colocar Maria, Mãe Cristo, ao mesmo nível da ‘padeira’ que matou sete castelhanos com uma pazada. Sempre o mesmo instinto de endossar aos deuses as escaramuças e guerras que os homens fabricam!
Segundo: desde a infância tenho ouvido que a nomenclatura ‘Senhora da Conceição’ significa que uma mulher – Maria – foi concebida e isenta do “pecado original”, isto é, foi a única que escapou à condenação inelutável por um crime que todo o bebé carrega aos ombros pelo facto de vir ao mundo… Esse crime – aleatório, sem conteúdo nem tipificação definida -  quem o cometeu foi Adão, levado pela Eva, o qual marcou como um ferrete cruel toda a criança recém-nascida. Até ao fim dos tempos será assim. Quem poderá suportar esta tremenda difamação, só de per si suficiente para instaurar um processo de injúria junto do Ministério Público!... Aqui, o mito atinge proporções dantescas. Para ser condenado logo que sai da barriga da mãe, melhor seria então não ter nascido...
Terceiro: isento de ‘pecado original’ é privilégio que torna o indivíduo imune ao erro e à deficiência, particularmente na área dos comportamentos e atitudes. Conclusão: Maria foi a mulher formatada para ser perfeita, dotada da ‘bossa craniana’ que lhe vedava o acesso a qualquer solicitação negativa. Por outras palavras, mesma que quisesse, ela não podia errar. E o mito chega agora ao cúmulo de considerar Maria como um autómato, quase um robot matematicamente predeterminado, enfim, Maria, regida pelo instinto, como as abelhas perfeccionistas que, desde o princípio do mundo, constroem infalivelmente o génio de um  favo de mel… Em sendo assim, conclui-se que a grande Mulher, mãe do “Homem mais Inteligente da História” (Augusto Cury), nenhum mérito teria por ser Santa, Perfeita, Imaculada Conceição… É implacável  a lógica do erro!
Quarto: todas as eventuais manifestações negativas do ‘pecado original’  (e são patentes, até  nas crianças, as deficiências inatas, a vários níveis) só têm um nome e uma fonte: a genética. Por desconhecerem, à época, as leis científicas da hereditariedade, os teólogos de então, com Santo Agostinho de Hipona à cabeça, recorreram a uma categoria ‘extraterrestre’, reveladora do castigo divino e a que chamaram o dito cujo nome. E, em vez de apelarem à autonomia do ser humanos, às suas virtualidades dominadoras e libertadoras, jogaram o problema para um ‘estádio’ superior – a teoria do ‘pecado original’. A ciência destruiu o mito de séculos. O Homem assume-se herdeiro de um processo dinâmico em que os genes de outrora vivem com ele. Dele depende a sublimação, a construção do monumento que traz virtualmente dentro de si. Neste entendimento, têm mais valor os que lutam pela perfeição holística do ser humano, como foi a autêntica Maria de Nazaré,  do que os que, segundo o mito,  nasceram robotizados, milimetricamente formatados, sem hipótese de errar.
Só há caminho fora do mito!

09.Dez.17
Martins Júnior
  






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