Quer
se lhe chame Independência. Autonomia, Emancipação ou Autodeterminação, o seu
gosto e o seu cheiro mexem connosco, galvanizam as baterias constitutivas do
nosso sistema neuro-vegetativo e mobilizam visceralmente todo o nosso
psiquismo. Aliás, é todo o ser vivo que participa desta energia oculta e
renovadora, desde a crisálida que se abre para dar voo à borboleta até ao fruto
que se liberta da flor que lhe serviu de berço. No composto humano, a
metamorfose é a linha recta que define a inaudita epopeia do crescimento, com
as consequências e erupções, tantas vezes dramáticas e preocupantes, sobretudo ao chegar à puberdade e, daí, à idade adulta.
Autonomizar-se, emancipar-se é um direito irrenunciável, porque inscrito no
mais íntimo do nosso ser.
Não
admira, pois, que o mesmo processo evolutivo transborde para o “Homem-em-Situação”,
isto é, para a vida societária, seja a mais
pequena comunidade, seja o mais extenso território. Mas é precisamente
aqui, nesta encruzilhada bio-psico-sociológica que confluem e se debatem
antonomias e paradoxos indissociáveis: de um lado, a tendência genética da
auto-condução (Independência ou Autonomia) e, do outro, a indeclinável
necessidade de pertencer a um corpo comum, um agregado estável e seguro que nos transmita
confiança e mútua produtividade, condição indispensável à sobrevivência
individual e colectiva.
E
surge a grande questão – quando, como e porquê romper com a raiz da árvore a que
pertencemos para fazer germinar, por conta própria, o ramo verde que nós somos?...
É a pergunta que se impõe a quem se decide executar ou, mesmo, analisar todo e
qualquer movimento revolucionário, chamado Independência, Autonomia ou
Secessão. Suponho e mantenho que é da resposta a esta questão que se podem classificar
de justas ou injustas, consequentes ou contraditórias, verdadeiras ou
populistas e demagógicas as revoluções independentistas. Na história, não são
assim tão raros os episódios em que rebeliões aparentemente heróicas
estatelaram-se num logro irreparável para os povos que tudo deram para a causa.
Justas
as lutas contra os regimes totalitários, esclavagistas. Consequentes as oposições
aos sistemas ideologicamente dogmáticos e
opressivos. Nobres e produtivas as reivindicações sindicais contra a exploração
do capital sobre o trabalho, desde que os seus líderes não sejam robots de centralismos partidários,
manipuladores de massas.
Não
há lugar hoje para passar no crivo da
lógica humanizante os diversos embates político-sociais conducentes à
emancipação dos povos, ao longo da história, nem mesmo os do tempo presente. E
não serão precisos demorados estudos de análise para concluirmos que, à sombra
e a pretexto de campanudas autonomias, o resultado foi a instauração de outras
formas de controle e ditadura, iguais ou piores que aquelas combatidas por
oportunistas prestidigitadores disfarçados de autonomistas e campeões do
independentismo. Eles são tantos, aos molhos. Aqui mesmo, entre nós. Sempre
afirmei que os auto-cognominados conquistadores da Autonomia da Madeira, “pós-25
de Abril”, outros instintos não tiveram senão instaurar, primeiro capciosamente
e depois despudoradamente, a ditadura do “24 de Abril”, da qual foram oriundos
e beneficiários privilegiados. Similarmente, em certos países africanos – e até
na Europa do segundo quartel do século XX – os corifeus de certos clãs e tribos demonstraram a olho nu que o seu ardor
“patriótico e revolucionário” era o de substituir-se no trono aos anteriores
dominadores, usurpando poderes e ultrapassando-os nas pilhagens dos recursos
existentes.
Saúdo
os valorosos homens que protagonizaram a luta do povo português explorado por
um soberano estrangeiro. É sintomático constatar que, em 1640, foi a Catalunha
que, em guerra contra o centralismo imperialista de Espanha, contribuiu
indirectamente para a vitória da
Restauração de Portugal.
No
entanto, fica o repto: Não é independentista quem quer. Aos fautores e líderes
dos movimentos autonomistas exige-se uma entrega total e isenta, cuja missão só termina quando vir o
seu Povo autonomamente libertado. Só esses é que têm direito a proclamar “Independência
ou Morte”!.
Em
síntese, para os esforços quotidianos em que cada um de nós luta pela sua justa
afirmação de personalidade emancipada,
deverá ficar escrita no portão do campo de batalha esta memorável palavra-de-campanha:
“A minha independência acaba quando começa a independência do outro”.
01.Dez.17
Martins Júnior
Sem comentários:
Enviar um comentário