Em
dia de Páscoa, ouso interpelar-Te, Jesus, em forma de Oração:
Perdoar-me-ás
a inteira lealdade com que me confesso. É que não me preocupa saber se voltaste
fisicamente à vida nem nunca daria um passo para encontrar o teu corpo ressuscitado.
Porque durante um percurso existencial de 33 anos nunca usaste a força física
nem sequer o vigor saudável do Teu corpo como objecto de confronto, muito menos de talismã de vitória contra
os Teus mais figadais opositores. “O Meu reino não é deste mundo – disseste-o
diante do juiz governador Pôncio Pilatos - o Meu é o reino da Verdade”. E já antes tinha-lo dito
à Samaritana: “Podes crer, mulher, que os verdadeiros adoradores do Meu Pai são
os que O procuram em espírito e verdade”.
É
por isso que o que mais procuro – desculpa a frontalidade – não é armação
biológica do teu composto orgânico, mas a pacífica e eficaz armadura do Teu espírito,
o princípio activo da Tua Ideia. Leio Paulo Apóstolo – “Se Cristo não
ressuscitou é vã a nossa fé” – e, sem prejuízo
da narrativa bíblica, leio a ressurreição da Tua mensagem, o propalar daquele “fogo”
purificador que trouxeste ao mundo. Os Doze conheceram-Te durante três anos,
beberam e comeram contigo, mas viste o resultado: um traíu-Te, outros
abandonaram-Te e até Pedro, tido pelo mais confiável, negou-Te, alegando que nem Te
conhecia. Não lhes faltou a presença do Teu corpo. Faltou-lhes, sim, a força do
Teu espirito.
É
assim, para meu desencanto, que Te vejo mais morto que vivo neste mundo que
habito. É verdade que homens e instituições erguem-Te no topo de tronos e
altares, mas Tu aí sentes-Te num cadafalso, como no Pretório de Pilatos. Porque
no sopé desses majestosos mausoléus, só existe a arena tribal onde os mesmos
homens se encarniçam como feras, destroem a paz, afogam a alegria de viver,
matam a inocência e a justiça. Matam-Te de novo. Podem apregoar hossanas e
alleluias colossais, mas é de um canto fúnebre o trágico colosso das suas
vozes. Porque eles preferem o Teu corpo ressuscitado em vez do Teu espírito
redivivo. Foi por isso que Pascal, amargurado, escreveu que “Jesus continua em
agonia até ao fim dos tempos”.
Mas,
Jesus histórico e eterno, tento desbravar montanhas e vales e encontro-Te vivo – mais nos vales profundos que nas
montanhas altaneiras – vejo-Te em tanta gente anónima que cumpre, que age com
amor, que luta na ruralidade do seu existir ou na escola ou nos hospitais ou
nas ruas denunciando, como Tu, Jesus, no Teu tempo, os crimes sociais e
exigindo leis justas para esta “Casa Comum” onde todos tenham o mesmo direito à
vida. Esses são os que amam o Teu espírito vivo mais que o Teu corpo idolatrado.
Por esta razão, atrevo-me a completar o pensamento de Pascal: Assim como “Jesus
continua em agonia até ao fim dos tempos”, assim também Jesus continua ressuscitando,
em renovada manhã de Páscoa, até ao fim do mundo!
Doce
Nazareno, Líder invencível, Divino Mestre, não serei eu o Tomé, inconsistente e
primário, que só entendia a linguagem empírica da fé no Teu corpo físico.
Ajuda-me a encontrar todos os dias e seguir com afã a Tua Ideia, o Teu espírito,
o Teu plano libertador.
Assim
é e assim será a “PÁSCOA NO CORAÇÃO DE ABRIL”!
Domingo de Páscoa, 21.Abr.19
Martins Júnior
Quem acompanha o Pe. Martins Júnior,essencialmente, sobre as suas reflexões sobre a Páscoa, sabe que sempre procurou exaltar a profundidade espiritual das mensagens do Cristo da história, em vez de, enfadonhas oratórias sobre o visionamento do seu corpo. Parabéns ao autor deste texto, por mais estes rasgos de luz.
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