segunda-feira, 27 de junho de 2022

“OH TÁLASSA, OH TÁLASSA” !!! – “PARA QUE SEJAS SEMPRE NOSSO, OH MAR !!!

                                                                                     


 

Ecoa ainda nos umbrais dos tempos o grito helénico, de espanto e euforia, diante do mar – Oh Tálassa, Oh Tálassa – entronizada a deusa emersa do Mar Mediterrâneo!

A mesma exaltação quase mítica parece invadir o planeta e dinamizar os humanos à procura do Mar, muito antes navegado. Prova-o a  que hoje se inicia em Lisboa. Dir-se-ia que é um outro mar – um mar de gente – a tomar conta do vasto Oceano: 7000 personalidades, 142 países, 17 chefes de Estado, 11 chefes de Governo, 113 ministros, 38 agências especializadas, 1178 organizações não-governamentais, 410 empresas, 154 universidades,  cientistas, observadores, jornalistas. No topo da grande pirâmide, o Secretário Geral da ONU, António Guterres. Comparado a outros magnos acontecimentos simultâneos, com chancela mundial,  desde a reunião dos G7 ao poderoso simpósio da NATO, esta Cimeira do Mar será talvez o fenómeno mais puro, mais ambicioso e mais determinativo em termos do futuro da humanidade inquilina das terras e dos mares.

Se a todo o português deveria ser motivo de curiosidade e preocupação, a um ilhéu – nado e criado neste Atlântico, berço azul líquido da Ilha – deveria sê-lo muito mais. Olhar o mar, interrogá-lo, ouvi-lo, desejá-lo, amá-lo e respeitá-lo! Por todos estes pressupostos lógicos, não poderia eu ficar indiferente a tão eloquente alarme ocorrido no nosso país.

É de um verdadeiro alarme que se trata. Antes que os ‘piratas da Terra’ se voltem para o Mar para raptá-lo e secá-lo na delapidação dos seus fundos, impõe-se uma reflexão séria para não deixar sair das docas as corvetas dos novos corsários, interessados apenas no lucro fácil.

Tem sido essa a preocupação dos oceanógrafos, dos estrategas do progresso e de muitos políticos preocupados com os ecossistemas planetários. Recordo-me da Conferência Internacional sobre os Oceanos  realizada na capital portuguesa em 1994, na qual tive a honra de participar,  a convite do então Presidente da República, Dr. Mário Soares. Ainda persistem dentro de mim os apelos feitos por -  e para - altos responsáveis do mundo que ali se encontravam. Alma dinamizadora deste encontro histórico foi o Dr. Mário Ruivo, personalidade ímpar como cientista, antropólogo, investigador, líder pragmático em missões da ONU e da UNESCU, cujos trabalhos e propostas estarão sobre a mesa deste congresso, durante os cinco dias da sua realização. A  gravura em epígrafe traduz um dos momentos marcantes do Encontro, com Mário Soares e Mário Ruivo, lado-a-lado.

Evoco propositadamente a Conferência Internacional de 1994 para assinalar a inércia e, mais grave, a indiferença dos magnatas mundiais (e dos aprendizes regionais e locais) da finança e da governança face às conclusões então aprovadas. Neste elenco deprimível e deprimido, estamos também nós, madeirenses, ao permitirmos que se tenha feito do nosso litoral um vazador de terras ‘oficiais’, descargas de betão desnecessário e poluidor, a pretexto da engenhosa rubrica obras públicas e consequente destruição da fauna e flora costeiras, interdição de acesso às praias livres que antes pertenciam a toda a população.

Para que ao imenso mundo oceânico possamos continuar a chamar o glorioso Mare Nostrum, façamos a nossa parte, fiquemos atentos à generosa enciclopédia dos mares que a presente Cimeira nos traz a esta estância “onde a terra acaba e o mar começa” – e, por consequência territorial, também   a esta rugosa Ninfa do Atlântico, a Ilha dos Amores, “que do muito arvoredo assim se chama”.

Depende de nós que a almejada “Economia Azul” não torne  mais negro o mar que nos rodeia e nos ondeia!

 

27.Jun.22

Martins Júnior

 

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