sábado, 11 de junho de 2022

TRIBUNO DA PLEBE E MESTRE DA ARRAIA-MIUDA

                                                                              


Tivera eu o verve inspirador e a grandiloquência retórica de Tibério Graco e seu irmão Caio Graco, século V a.C., e ergueria a voz sonora e grave para tecer os maiores encómios ao “Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades” que ontem inundou de glória e autoestima os cantos e recantos da Lusa Pátria.

Por mais garrido e tonitruante que tenha sido o espectáculo, de tudo, tudo o que aconteceu,  o que ficou na retina e na alma foi o “Povo Português” garbosamente exaltado pelo Supremo Magistrado da Nação. Por palavras suas, deambulámos sete séculos da nossa nacionalidade e vimos na Braccara Augusta o “Mestre de Avis” colocando nas ameias do castelo vitorioso de Lisboa de 1833 a “Arraia-Miuda”, sem a qual nunca Portugal reconquistaria a soberania ameaçada.

Mas não ficou por aí a memória de um passado que a História se encarrega de repetir. Andei mais longe, percorri mais dezoito séculos em direcção à República da Roma Antiga e pareceu-me ouvir os irmãos Graco, os dois mais inflamados Tribunos da Plebe, arvorando com bravura os direitos do povo face os abusos dos ‘Patrícios’.

Exaltar o Povo Português, os cabouqueiros anónimos desta imensa urbe renascida e multiplicada por todo o planeta – eis a engenhosa quanto talentosa bússola que guiou Marcelo Rebelo de Sousa neste revolto mar contemporâneo, em que se estilhaçam obuses, liberalismos, híper- nacionalismos, supremacismos megalómanos, enfim, um marulhar ensurdecedor onde ninguém se entende – e todos sob a bandeira do passado e repassado patriotismo de bandeira.

“Onde a terra se acaba e o mar começa” – assim falou Camões. E foi assim que vi e interpretei os dois discursos do Dia.

Jorge Miranda  - a terra firme – Homem do Direito, ‘Pai da Constituição’, mapeou a nossa história, as virtudes e os defeitos, não se coibindo (com rara frontalidade) de denunciar os atentados à Língua Portuguesa na comunicação social e afins. Logo a seguir, a vastidão do oceano em ondas aladas, clangorosas, Marcelo Rebelo de Sousa, alcandorando até às constelações estelares “o corpo, a alma e a saudade” de que se fez o Povo de Portugal, culminando com o estandarte maior do seu tronco centenar: “Sem a Arraia-Miuda, não seria hoje o que é Portugal”.

Duas notas apenas de alguma dissonância. Exaltou-se o Povo, no discurso  relevaram-se os ‘Plebeus’, mas na tribuna só lá estavam os ‘Patrícios’. Para serem inteiras as palavras, deveriam lá estar também os representantes do Povo, o sindicalismo, o operariado, o campesinato, os marítimos, as mulheres trabalhadoras. A outra nota: embora em tempo de guerra e mesmo que se tenha dito que ‘um povo em armas procura a paz’, era dispensável tanta ostentação de material bélico e tanta farda para canhão. Longe de nós rivalizar com a barbárie russa ou a obesidade disforme das paradas norte-coreanas.

Em síntese: porque sou português de Machico, também foi para mim o Dia de Portugal. Por isso, aqui deixo as minhas saudações mais calorosas pela amplitude das mensagens proferidas, lamentando que daqui da ilha, as pudicas vestais da política regional se tenham coçado com os pruridos imaginários de um convite que não sabem onde o puseram…

E um VOTO: Que sejam os governantes verdadeiros Tribunos da Plebe e nunca fechem os ouvidos aos apelos da “Arraia-Miuda”.

Só assim é que seremos Portugal !!!

 

11.Jun.22

Martins Júnior       

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