Foi em Julho, transição
para o Agosto promissor, que Lisboa viu largar as caravelas, desde Santa Maria
de Belém, rumo às Índias do Preste João, de onde vieram as preciosas
especiarias que fizeram da capital portuguesa o mais poderoso porto comercial
da Europa e centro agregador da navegação estrangeira. Aconteceu em 1497.
Volidos cinco longos
séculos, eis de novo Lisboa no centro do mundo e Belém cognominada “”Cidade da
Alegria”. Invertem-se os factores geo-topográficos: quando antes se repetia que
“todos os caminos vão dar a Roma”, agora durante mais oito dias corrige-se o aforismo e
sem risco de errar: “Todos os caminhos vão dar a Lisboa”. Não há quem aguente ‘impávido
e sereno’ a euforia regurgitante que salta de centenas de milhares de jovens que
tomam conta de Portugal e até nos fazem perguntar como é que a baixa ribeirinha
de Lisboa não vai ao fundo com o peso mundial que lhe cai em cima.
O grande protagonista
visível tem nome: Francisco Papa, que se apresenta como o PEREGRINO DA PAZ.
É plurissémica, universal
e, por vezes, contraditória a nomenclatura sublime, quase sagrada atribuída ao
apostólico Peregrino. E surgem, indistintamente, certas interpelações face ao
multiforme ritual que o Protocolo lhe estabeleceu, talvez contra a mais intimista
das suas convicções.
Entre muitas, há uma –
nada despicienda - das questões, que se pode formular nestes termos.
Sendo o Papa, ‘Representante
de Cristo na Terra’, Pontífice da Fé e Pastor de uma Confissão Religiosa, a
Igreja, por que razão, chegando a Portugal e pisando a ´Terra de Santa Maria’,
não se dirige prioritariamente à Sé Patriarcal, pelo contrário, os seus passos
primeiros encaminham-se para Belém, não ao presépio do Menino Jesus, mas ao
Palácio, onde mora o principal Magistrado da Nação, Chefe Supremo das Forças
Armadas e Lídimo Intérprete da Política Portuguesa, Presidente da República, portanto,
de um reino deste mundo ?!...
A pergunta toma outro
volume e maior conotação, ao vermos anunciado publicamente que o Primeiro
Ministro dirigir-se-á à Nunciatura Apostólica em Lisboa para apresentar
cumprimentos ao Papa.
Quer num caso quer noutro,
omitem-se os nomes dos titulares, apenas os cargos que ocupam, pela simples
razão de que, fosse qual fosse a sua identificação pessoal e seja qual o país
visitado pelo Papa de Roma, o Protocolo seria cirúrgica e rigorosamente o
mesmo. Mais perto de nós, o Papa Bento XVI, visita ao Porto, encerrou a sua presença
em solo português na espectacular varanda da Câmara Municipal.
Porquê?
Aos que monitorizam e se
incomodam com este aparato contraditório – reino espiritual versus reino temporal –
a explicação reside na definição do estatuto do Sumo Pontífice de Roma. Ele
próprio condensa em si mesmo a simbiose dos dois reinos: ao mesmo tempo que se
apresenta como Sucessor de Pedro, o Pescador, Pastor da Igreja, ele está também
investido do poder de Chefe de Estado do Vaticano.
Portanto, o Papa dará
prioridade ao seu estatuto de Chefe de Estado e, logo ao desembarcar em Figo Maduro, tem obrigatoriamente marcado o
rumo directo a Belém. Por seu lado, a ida do Primeiro Ministro à Nunciatura tem
uma justificação óbvia: a Nunciatura Apostólica é a sede da Embaixada do Estado
do Vaticano em Portugal.
Para os mais curiosos, no
seu legítimo direito de serem informados, aqui ficam em termos simplistas as
razões – com ou sem razão! – dos primeiros passos de Francisco Papa em
Portugal.
31Jul-1Ago.23
Martins Júnior
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