Hoje
Portugal veste-se de treze. Logo hoje, sexta-feira. dia treze – a data “fatídica”
que aterrorizava Frei Dinis, das Viagens
na minha terra, de Almeida Garrett. O dia em que o tão poderoso quanto supersticioso
“Rei” Roberto Carlos nunca sobe a um palco para cantar. Per fas et nefas (”seja como for”) o certo é que, em chegando a Maio, crente que reze e turista que
se preze envergam o nº13 de uniforme. Agitadas as campânulas dos corações,
todos de longe ou de perto acorrem ao Santuário que tomou por toponímia o nome
da filha de Maomé, “Fatuma”, de seu muçulmano baptizo.
Pisando
o chão da Cova da Iria ninguém ouse pisar a crença de cada qual. Mora no mais
secreto e indizível Tabor a sua fé, fonte de todos os gestos e expressões. É
nesta postura, de sentinela em sentido, que me perfilo, todas as vezes que por
lá passo.
Nem
sempre é esse, porém, o retrato que nos devolvem os comunicadores, os propagandistas,
os que vestem 13, só para fora. Dou por (mau) exemplo, os títulos jornalísticos
que transcrevi em epígrafe: “Fátima,
o maior centro europeu de turismo religioso… 30 milhões são negociados em
presentes, imagens, terços, medalhinhas. Até a garrafinha de água, 14cm,
vende-se por 5,50€… Para o próximo ano,
o do centenário, já estão esgotados os hotéis num perímetro de 50 KM. Cada
quarto, por uma noite, custa 300 euros.
Entre os muitos jogos infantis,
vem também o velho “jogo da glória” que mistura dados de póker e pastorinhos a
andar, a andar, até chegar a um desenho pintado de coração vermelho no meio de
um cartão e a que dão o pomposo cognome
de “Coração de Jesus”.
Isto
já me está a causar urticária no cérebro, só de tragar as gordas parangonas dos jornais. Para
cúmulo, caem-me os olhos e cai-me a fé quando vejo numa revista hebdomadária um
anúncio, tipo descoberta das ondas gravitacionais, que reza assim, ou mais do
que assim: Marcelo Rebelo de Sousa, Soares dos Santos, Mota Engil e oum empresário obcecado deram as mãos para produzir proximamente um
filme de animação ( um filme de milhões) sobre o Papa, os pastorinhos e Nossa Senhora, com vozes de artistas em
fundo.
Nesta
enorme redoma de um sol rolante, de várias cores ( como a que fez manchete em determinado
jornal do incrível) já não se sabe onde pára Nossa Senhora, a da Azinheira.
Onde a mensagem de Maria de Nazaré? Onde a estreita vereda que nos leva até
junto de Seu Filho?
Permitam-me
expressar o repúdio visceral que me assoma quando vejo acontecimentos distintos, sublimes
iniciativas culturais, a arte, a música e a poesia, os livros, ficarem reduzidos a maços de cifras de vendas e cheques bancários. Revolta-me até a
distorção do próprio desporto, o futebol por ex., transformar o talento atlético,
o rectângulo, a baliza, o relvado, os árbitros, a cabeça e os pés, embrulhados e mensurados
pelo cobertor de notas dos empresários agiotas!
Mas
insuportável, nauseabundo mesmo, é que isto se passe no Altar do Mundo ou em
qualquer altar de aldeia, onde deve imperar a transparência do sagrado, o intimismo
inacessível de alma que conduz à mais
pura espiritualidade. Não suporto. Abomino. Fujo a sete léguas deste sacrílego
incesto, vergonhosamente praticado diante do Altar para espectáculo mundano. Não vou, nunca irei por
aí!
Se não incomodar seja quem for, atrevo-me a
confessar que não me revejo em certas
devoções exibicionistas, algumas delas marcadas de um doentio masoquismo e,
depois, marteladas pela imagem dos áudio.
visuais que nos chegam a casa. Sinto
ressoar aos meus ouvidos o doce rebate do Nazareno: Quando jejuares e fizeres penitência, não desfigures a face como os fariseus
hipócritas para serem vistos. Pelo contrário, lava o teu rosto, perfuma a tua
cabeça… e o teu Pai, que vê no oculto, dar-te-á a recompensa . (Mt.6,17). E
ainda: O bem que fez a tua mão direita, que o não saiba a tua mão esquerda.
(Mt.6,3)
Quero
ficar hoje despido da camisola 13. Prefiro revestir-me da transparente beleza daquela mensagem que meditei
com os crentes no primeiro acto da manhã.
O nosso J:Cristo respondia assim a quem lhe trouxera um recado da “Tua Mãe e dos Teus irmãos que
querem falar contigo”: Quem é minha Mãe e quem são os meus Irmãos?
--- São os que fazem a vontade do Meu Pai. (Lc.8,21).
O
resto é paisagem.
13.Mai.16
Martins Júnior
Sem comentários:
Enviar um comentário