sexta-feira, 5 de agosto de 2022

ENFIM. MACHICO FEZ TEATRO … COM BERTOLD BRECHT !

                                                                          


            Mesmo que ninguém o diga, toda a gente o vê: Machico é diferente!

         Diferente, porque alia  - e até antecipa - o sabor do espírito ao prazer gustativo da arraia-miuda que tipica os arraiais, Foi o que se viu no  evento do princípio de Julho, quando afirmou e sublinhou o encontro convivial em Machico e a que deu o sugestivo  título de “Arte e Pesca”. Outro tanto (e com maioria de razão e efeito) assomou no decurso da “Semana Gastronómica”, com a peça de teatro “As espingardas da Senhora Carrar”.

         Pela fruição plena do evento e pela mensagem possante que dele emanou, não poderia o blog dos Dias Ímpares deixar passar incógnita esta hora ímpar da Arte Dramática em terras de Tristão Vaz. Primeiro, pelo autor – Bertolt Brecht. Depois, pela actualidade histórica do conteúdo, escrito embora em 1937 a propósito da guerra civil de Espanha, ganha um força anímica e um acento impressivo se o aproximarmos do trágico cenário que nos coube viver na invasão russa contra a Ucrânia.

         Em confronto aberto desfilam em palco as duas teses opostas e os dois comportamentos contraditórios: de um lado, o pacifismo imobilista dos defensores da paz, mesmo tendo por factura inexorável a humilhação e a perda da dignidade existencial. Do outro lado, a luta esclarecida e sem tréguas contra o opressor, ainda que seja exigido, em última instância, o recurso às armas. A intuição de Brecht – e que arrasta o espectador para dentro da cena – está na objectivação do conflitop psico-sociológico, não  ao nível da pura ciência política, mas no seio de uma família da classe proletária, mais precisamente, numa aldeia de pescadores. É de um realismo inquietante o dilema familiar entre o resignar-se ao ditador e o afrontá-lo de corpo e alma armados, ainda que com risco da própria vida, Acabou por vencer a opção da luta, em homenagem aos que já tinham sucumbido na frente da batalha!

         Para além do autor e da oportunidade d“As Espingardas da Senhora Carrar”, ficou patente aos olhos do público o desempenho de todos os personagens - dicção, economia gestual, intensidade emotiva, sobriedade cénica – sob a direcção dos professores Lucinda Moreira e Fábio Ferro, uma produção da recém-criada “Oficina d’Arfet Teatro”. Bem hajam. E venham sempre!

         Titulei este apontamento com um “Enfim, Machico fez Teatro”. E mantenho-o. Porque a amostragem de publicidade enganosa que tem passado a opinião pública sob a designação de “Teatro em Machico” não tem sido mais que  uma agência empresarial  de contratação do exterior, valendo tão-só por esse ofício.

         Todos não somos demais para reerguer a eloquente Arte Dramática em Machico. Eis o abrir e o fechar do pano d”As Espingardas da Senhora Carrar”.

 

         05.Ago.22

         Martins Júnior

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