quarta-feira, 3 de agosto de 2022

ENTRE A “ARMA DO TRIGO” E O “MILHO DA ESPERANÇA” – ASSIM NAVEGA O MUNDO… E A ILHA TAMBÉM!

                                                                                 


Ao partir de Odessa o barco primeiro carregado de milho, António Guterres, Secretário Geral da ONU, teve um invulgar  rasgo de eloquência e duro realismo quando afirmou: “Aquele barco leva dois carregamentos, qual deles o maior: o Milho e a Esperança”.

         Um mês antes, o Courrier International citava o articulista do Washington Post  e estampava na capa da revista, com um expressivo trigal em fundo,  esmagado pelos tanques russos: “L’ arme du blé” – a Arma do trigo.

         Paradoxal e tremenda radiografia da sociedade humana: de um lado, o Trigo, o rei dos cereais, transformado em arma de guerra, retida nos enormes paióis agrícolas. Em vez de pão para a boca dá munições para a morte. Por outro lado, o Milho, o sustento dos famintos e dos animais domésticos, esse é que alimenta uma réstia de Esperança no meio da tormenta.  

A isto chegámos, após séculos de evolução e crescimento. As classes dominantes, detentoras do capital e dos meios de produção, organizam-se em fortalezas de bronze (nos bancos, nas empresas, nos paraísos fiscais) prontas a disparar ao menor sinal de alarme social. Nos antípodas da sociedade,  os pobres, os operários, os refugiados, enfim, o proletariado, mesmo atirado para a vala anónima da plebe, é quem projecta ainda um halo de Esperança nos dias futuros.

         Em tempo de verão relaxante e restaurador de saúde e optimismo, quase se nos repugna debruçar o olhar sobre este charco de batráquios em terra seca. Mas é o que aí está patente, nu e despudorado diante de todos nós. A sanha cega e surda de um homem só contra todos: se não consegue atingi-los com os mísseis supersónicos, então estrangula-os com o garrote da fome!

Não restam dúvidas de que voltámos à barbárie da selva, do “olho por olho e dente por dente”. Do “homem, lobo do outro homem”.  Quem  suporta ver toneladas e toneladas de trigo bom a apodrecer diante de bocas esfomeadas, indefesas,  a gritar pela vida de um naco de pão?!...  Qualquer cidadão do mundo, dotado de um mínimo de bom-senso, outra reacção não teria senão tapar o rosto, cobrir-se de vergonha e fugir, fugir sem rumo certo até encontrar nem que fosse uma nesga de mar e aí afundar-se e afundar toda esta peçonha fedorenta que nos servem à mesa todos os dias…

Mas o trágico da situação é nem assim conseguir-se-ia afundá-la, essa crápula abjecta de um indivíduo, a cuja espécie genética também pertencemos. Um indivíduo e um regime!

Indivíduos e regimes que não são um exclusivo endémico do solo russo. Também por aqui deitam raízes que vêm à superfície, sobem-nos pelas pernas acima, apertam-nos as veias, desestabilizam-nos o coração e a mente – a vida. Todos os dias, mesmo sem nos apercebermos disso. Ai, a corda da fome enrolada ao pescoço de crianças e idosos dependurados ao relento das horas, sem ninguém que lhes valha! Ai, a vingança requintada de governantes – até dentro dos muros da religião - contra quem se lhes opõe  em nome da Justiça e da Verdade!!!

Ainda ecoam aos meus ouvidos e de todos os que tomaram conhecimento de um governante ilhéu – para mim, de sangue mestiçado entre Hitler e Putin – que vociferava em redor da Ilha: “Para Machico, nem um tostão”. E de um outro ‘sócio’ colaboracionista bispo que às Irmãs, freiras do Convento da Caldeira (a única instituição católica que fabricava e vendia  hóstias a todas as paróquias da Madeira) sim, proibiu-lhes de fornecer as hóstias para as missas  na igreja da Ribeira Seca… O garrote financeiro a Machico e o garrote da fome eucarística aos cristãos da Ribeira Seca. É cru e é cruel o que escrevo, mas é a realidade inexorável que se viveu. E que poderá vir a acontecer se os madeirenses não estiverem vigilantes.

Enquanto o “Milho da Esperança”  faz-se às ondas para matar a fome a um povo carente, transformemos a Esperança em Trigo de Certeza de um Mundo Melhor. Pela nossa vigilância e pela nossa intervenção!

 

03.Ago.22

Martins Júnior  

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