Não
vou desafiar Júlio Verne que deu “A Volta ao Mundo em oitenta dias”. O grande
perímetro circular do território físico do planeta é incomensuravelmente mais
moroso que a maratona – infinitamente mais vasta - do espírito que habita o
mesmo planeta. E ficamos diante deste paradoxo sem remédio: enquanto os pés
arrastam-se pesados sobre a crosta, inerte umas vezes, movediça outras, o
cérebro, o espírito (a Ideia, como a exalta Antero de Quental) esse voa,
sublima-se e esmaga-se, morre e reaviva-se, ‘pula e avança’ num movimento de
metamorfose contínua, tão contraditório quanto incompreensível.
Porque são os humanos que transportam o
espírito e o põem em marcha na história do mundo!
Recorro ao dia de hoje, 9 de Novembro. Foi proclamado pelo
Parlamento Europeu como o Dia Internacional contra o fascismo e o
antissemitismo e tem a ver com o início, em 1938, da feroz perseguição do
regime nazi contra os judeus que culminou no execrável massacre do ‘Holocausto’.
Quão doloroso e longo é o percurso até chegar ao fim da noite fascista e
alcançar a manhã da Liberdade!
Estamos
em 1989, precisamente em 9 de Novembro: o mundo alvoroçou-se, subiu às alturas
enquanto caía em escombros o vergonhoso muro em cujo betão se escondia o genocídio
ciclópico de milhões de vítimas do bárbaro regime soviético. Após o 8 de Maio
de 1945, esta foi mais uma retumbante
vitória para o Dia Internacional contra os regimes fascistas, totalitários!
A
história faz o seu curso em cada país e em cada segmento civilizacional. Também
em Portugal. Aconteceu a grande vitória contra o fascismo em 25 de Abril de
1974. Não foi caminho brando a travessia de 48 anos de regime
fascista-salazarista, carregado de maldições, exílios, prisões, mortes e guerras
coloniais. De entre os lutadores pela vitória contra o fascismo, presos, ostracizados, torturados nas
masmorras da ‘Pide’, emerge com notória grandeza patriótica um cidadão
português, nascido no dia 10 do mesmo mês de Novembro, 1913: Álvaro Cunhal!
Qual tenha sido a sua opção política, é incontornável o seu contributo, com
risco da própria vida, para destronar o fascismo em Portugal
Amanhã,
portanto, 10 de Novembro, um marco pré-natalício
do “Dia Novo” em Portugal!
A
marcha da libertação de um povo traz-nos, esta semana, um outro passo em
frente: a Independência da Pátria Angolana. Após a ocupação portuguesa de
quatro séculos, agravada com a injusta guerra colonial, chegou o 11 de Novembro
de 1975, em que os três movimentos independentistas envolvidos em sangrenta
guerra civil, reuniram-se sob a presidência de Agostinho Neto e ergueram a
bandeira da Independência. Por muito que os exploradores ocupantes do
território angolano invectivem o que apelidam de “Descalabro da
Descolonização”, o juízo da história condenará sempre o regime insustentável de
um minúsculo país europeu pretender dominar, enjaular a liberdade autonómica de
uma extensa nação africana. Até então, Portugal era visto como o pária da
civilização, retardatário, tacanho, vilipendiado e ridicularizado
internacionalmente. Chegara, enfim, o “Dia Novo” do Povo Angolano, com todas as
vantagens e todos os riscos que isso representa.
11 de Novembro - surge, pois, diante dos nossos olhos como
uma terceira vitória consecutiva contra o fascismo!
Mas
esta luta está longe de ser uniforme e simultânea. São os humanos e o seu
espírito que comandam a história, controlam as oscilações e “fazem a Hora”, na
lúcida expressão de Sophia - a Hora da apoteose democrática ou as desoras do
fascismo tenebroso, estrangulador. Daí que assistamos, não poucas vezes, a uma
estranha proximidade entre uma região, uma freguesia, onde se respira o ar puro
da Liberdade mútua e, na fronteira, um lugar de prisão dentro da própria casa,
da freguesia, da região, onde impera sob as vestes mais subtis o férreo bastão
do fascismo. Compete ao cidadão comum destrinçar os sintomas identificativos de
um e outro sistemas e, mesmo que ‘condenado’ a viver coarctado no seu livre
arbítrio, nunca perca a visibilidade sociológica e o redobrado empenho em mudar
as estruturas políticas negativistas.
Nesta
rota dos dias de Novembro, passamos pelo cabo das tormentas de um desses regimes
draconianos, aquele que, em 1991, perpetrou o crudelíssimo massacre no
cemitério de Santa Cruz, em Timor. Por contraste dos tempos e para ironia dos
factos, foi dali, da mansão dos mortos, que arrancou a escalada triunfal,
iniciada anos antes pelos bravos combatentes nas montanhas de Timor Lorosae,
até à vitória final contra o fascismo indonésio.
Em
12 de Novembro, tocam a rebate as
trombetas da memória para nos alertar contra as emboscadas da guerrilha
fascista, quer se chame putinismo, trumpismo, bolsonarismo, seja no Irão, na
Itália, seja mesmo à nossa porta, sob as mais sofisticadas formas.
E
chegamos a 13 de Novembro de 1460 – o
mesmo que dizer a 13 de Novembro de
2022, dia do Infante D. Henrique. No 562º aniversário da sua morte,
exalta-se o Génio das Descobertas, deste modesto Portugal que “deu novos mundos
ao mundo”. Se, por um lado, honra-nos sobremaneira a epopeia dos “mares nunca
dantes navegados, mais do que permitia a força humana”, por outro, atravessa os
séculos o clamor austero do sábio Velho do Restelo quando rotulou de “glória de
mandar e vã cobiça” a demanda dos oceanos. É a grande incógnita que ainda hoje
enfrentam os estudiosos da história: terá valido a pena a saga dos países
colonizadores europeus sobre as ancestrais civilizações dos povos indígenas
colonizados?... É daqui que proliferaram raízes espúrias de fascismos e lutas
subsequentes que ainda hoje persistem no nevoeiro dos tempos.
Cinco
dias consecutivos que hoje antecipamos e nos despertam para o nosso lugar na
análise e na construção da parte que nos cabe realizar!
09-11.Nov.22
Martins Júnior
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