Embora antiquado e em
vias de extinção – ou talvez por isso – o título de Rei a Igreja quis mantê-lo
e até entronizou-o todos os anos, dedicando-lhe um Dia, esse sim, Ímpar, o
vértice de todo o ano litúrgico, o último Domingo do Calendário Canónico.
É
hoje, o encomiástico “Domingo do Cristo-Rei”. Os templos ornamentam-se de
engalanados ouropéis, os eclesiásticos revestem-se de alfaias bordadas a ponto
de ouro e prata, os olorosos incensos orientais rodopiam inebriantes sobre a
cabeça dos participantes presenciais ao culto dominical.
Das
reminiscências inspiradoras da Magna Festa do “Cristo-Rei” e dos monumentos
espalhados pelo mundo não vou debruçar-me; apenas lembrar a pujante tradição
hebraica de atribuir- ao líder do povo hebreu a tríplice prerrogativa de
“Sacerdote, Profeta e Rei” E, a partir do século III da nossa era, por decreto
imperial de Constantino Magno, o estatuto monárquico outorgado à Igreja, até
então proscrita e perseguida pelo Império de Roma.
De
entre todas as reflexões feitas em cada
ano, desta vez vou monitorizar os dois ‘picos altos’ do devocionário oficial da
instituição eclesiástica, os dois ícones que mis cativam a sensibilidade dos
crentes. Um é a predominância do símbolo do sofrimento, a Cruz. O outro é a
magnificência da Realeza e, mais que Realeza, autêntico Império, atribuído ao
Rei-Cristo e o movimento, depois instituição que ele fundou. Não deixam de
aparentar os dois títulos ou devoções uma certa contrariedade terminológica e vivencial.
Parece não coincidirem relativamente aos
seus destinatários: para uns, a Cruz, o Crucificado, para outros o prestígio, o
trono real.
E assim é, na realidade.
Ao arvorar-se a Cruz, como caminho de salvação, propõe-se aos desfavorecidos da
vida a aceitação do sacrifício, da pobreza, da resignação. Ao pregar-se, porém,
o Reinado de Cristo, a sua configuração aproximativa aos reis e respectivos
tronos, o destinatário é outro: a hierarquia, o poder, a supremacia dos
titulares desse poder.
E por aqui me fico,
deixando ao livre curso interpretativo de cada um o desenvolvimento das duas
premissas mencionadas. Para ajudar, talvez convenha consultar o LIVRO, nos dois
excertos propostos para este fim-de-semana: II de Samuel, 5, 1-3 e Lucas, 23,
35-43.
Aceitarão os donos do
Reino a Cruzc como seu trono preferencial?..
19.Nov.22
Martins Júnior.
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