Deixei ficar entre aspas, autonomamente, cada uma das designações em epígrafe. Razão: nenhuma delas me pertence. A primeira tem a assinatura do Bispo do Funchal, há três dias na assembleia regional do clero. A segunda tem alguns anos, proferida por um dos sacerdotes no retiro anual aquando da apresentação-identificação ao orientador do evento, na sessão de abertura. E justificou: “Tenho quatro paróquias”.
Neste duplo e, por isso, estranho estatuto – padre e bombeiro – está condensada a situação (perdoem-me o anglicismo stablissement, porque mais amplo e expressivo) da Igreja madeirense, no que concerne ao provimento das suas 96 paróquias.
A ’confissão’ do Prelado não se resume a uma seca parcela da estatística regional. A montante, pressupõe um extenso e exigente aprofundamento científico do vazio dos Seminários, numa ilha que possui dois históricos, imponentes, aristocráticos estabelecimentos de formação eclesiástica, um deles a desfazer.se sob uma fria indiferença geral. Respon. A jusante, a dita ‘confissão’ rasga pistas de incomensurável projecção e não menos coragem na paisagem pastoral da Madeira e respectivos pastores.
Compulsando as duas coordenadas, impõe-se uma questão inultrapassável: Qual a missão, a função, a dinâmica do padre nos tempos actuais ? Só respondendo a esta questão, poderemos saber se temos 30 padres a menos ou 30 padres a mais. Apropriando-me de um princípio elementar da ciência económica – não é gastando mais que se gasta melhor – é curial concluir-se que não é por multiplicar-se o batalhão de sacerdotes que se aumenta o rebanho, a Igreja, o autêntico e genuíno Reino que nos trouxe Jesus de Nazaré.
Porque o problema levar-nos-ia a um longo curso teológico e a as múltiplas teses de interpretação pastoral, vou limitar-me à observação analítica e paradoxalmente sintética da fenomenologia dita religiosa do quotidiano madeirense – e não só.
Ei-la:
Enquanto a fé e vivência dos crentes e enquanto as hierarquias eclesiásticas se iludirem com o espectáculo dos rituais litúrgicos, com os ex--votos pios, as procissões de velas, pernas, barrigas, cabeças de cera, óleos-bentos, águas-bentas, ofícios e missas para fazer de Deus um juiz corrupto que dá sentenças por dados e ofertas, enquanto se deseduca o povo com confissões branqueadoras de roubos, traições, aleives e ofensas a terceiros, enquanto isso…NÃO HÁ PADRES QUE CHEGUEM !!!
Por outras palavras, enquanto o objectivo consistir em fazer das igrejas vistosas o epicentro da IGREJA DE JESUS DE NAZARÉ, poderão multiplicar padres como cogumelos, que não chegarão para as encomendas. E o efeito será como o do “feitiço contra o feiticeiro”: ficarão as igrejas cada vez mais vazias e haverá então padres a mais.
Sei que esta minha análise suscitará opiniões muitas, certas e incertas, dúbias, talvez calorosas de sentido inverso. Têm todo o direito de fazer a sua apologética. Também porque as minhas observações carecem de mais extenso aprofundamento justificativo que não cabe neste meio comunicacional, Poderei voltar, em tempo oportuno.
Termino com uma breve constatação: o Padre deverá configurar-se à imagem e semelhança do seu Mestre: Educador do povo, Promotor das mentalidades claras, desinibidas, auto-responsabilizadas. Pedagogo dos essenciais valores humanos e crísticos, vividos mais fora do que dentro das igrejas monumentais.
E assim deixará de ser ‘bombeiro’ para tornar-se Salvador da pessoa integral e Regenerador da humanidade global, como o seu Líder, cujo púlpito era a rua e revolucionou o mundo com apenas um punhado de doze homens do povo.
19-20.Jun.23
Martins Júnior
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