A falta que me tem feito o regresso àquela hebdomadária, indefinida e
indefinível estação que dá pelo repetido título de fim-de-semana! E princípio
de outra. Tão estreita e tão longa, que umas vezes é oásis e remanso, outras é
abismo e agitado oceano, outras ainda é voo vertical ao incógnito mundo
estelar.
Pois, é
hoje que volto pela mão do, outrora, publicano, cobrador de impostos,
transformado depois em comunicador fidedigno e testemunha ocular do quotidiano
do seu Mestre pelos caminhos da Galileia. Digo ‘comunicador fidedigno’ porque
limita-se à reportagem nua dos factos, como narrador directo, sem a preocupação
de adjetivar a evidência nem sobredourar as circunstâncias.
Convido-vos a abrir o seu LIVRO, no capítulo IX, 36-X,8.
Jesus
chama os seus Doze colaboradores, cada um por seu nome. Não consta que lhes
presenteasse com um protocolo ministerial nem mesmo com os odores e unguentos
dos óleos rituais inerentes ao cerimonial judaico do sacerdócio real.
Trago aqui, neste instante, as judiciosas conclusões do grande teólogo-filósofo
Anselmo Borges, quando defende que Jesus, ao chamar os Doze, não lhes conferiu
nem sombra daquilo que hoje se empolou sob a sacro-esotérica designação de
‘Ordenação Sacerdotal’. Chamou-os - pura e simplesmente - e apresentou-lhes ao
que vinha, o seu programa, pelo qual deu a própria vida.
Duas
linhas paralelas, indissociáveis, que na letra e no espírito ganham todo o
vigor das linhas vermelhas, incontornáveis:
1. Acção social, humanitária, libertadora de inúteis traumas psíquicos, as
neuroses (‘os espíritos impuros’) e das invasivas perturbações orgânicas
(‘doenças, lepra, paralisia, morte’).
2. Gratuitidade absoluta. Como que adivinhando eventuais objecções por parte
dos Doze (servir gratuitamente?...) o Mestre, Pedagogo e Líder responde-lhes
com um argumento de antecipação; “É assim, porque tudo isto, poderes,
competências, privilégios, eu vo-los dou de graça. E se recebestes de graça,
dai de graça também”.
E sintetizou tudo no enunciado da
sua Constituição Única, Sobre--humana: “Dizei às gentes que Este é o Meu Reino
e ele está perto de vós”.
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Preferiria ficar por aqui, na contemplação de um mundo em que as relações
humanas fossem pautadas pelo único normativo do bem-fazer – um
autêntico global wellfare – sem a exclusiva
tele--hegemonia do lucro, da exploração do homem pelo homem. Mas somos
confrontados com o monstro da macroeconomia e asfixiados com os répteis da
microeconomia, o reino dos olhos--por-dentes e dentes-por-olhos, dou-te se me
deres, etc.,etc..
Mais doloroso será compararmos o “Reino do Nazareno” com dezassete séculos
de Igreja que em cima desse Reino os homens altearam, oparam, locupletaram-se.
Tratar Deus como o banqueiro-mór, Jesus de Nazaré como o chefe dos
publicanos, agiota da feira, e pôr na sua boca o que nunca ousara dizer – dou-te
se me deres, concedo-te as indulgências, faço-te os favores se me
pagares…velas, missas, ouro, prata, prédios, colunatas de Bernini, cúpulas,
capitólios, e quejandos – é este o propagandeado e camuflado
culto Àquele que preceituou sem ambiguidades: “Recebestes de graça, dai de
graça”. Paradoxo contra-natura: “O Ofertório de todas as missas do
próximo domingo chama-se dinheiro de São Pedro e deverá ser
entregue no Vaticano”.
A partir do ano 313 ergueram-se duas Igrejas no mundo cristão: a
Igreja da opulência, imperial, dogmática, aquela que de perseguida passou a
perseguidora. A que nada tem a ver com o seu Fundador e, oficialmente,
constitui a maioria. A outra, a Igreja das catacumbas romanas e das
catacumbas de todo o planeta, doméstica, convicta, martirizada mas de fronte
erguida. Construtora da verdade, da saúde, da fraternidade. É a legítima
sucedânea do Legado evangélico, embora seja sempre a minoria no ‘ranking’
oficial eclesiástico, tal como o seu Mestre no tempo da ditadura judaica
de Jerusalém.
Desde o
século IV até ao século XXI e até sempre será assim.
Teremos
até o megalómano, milionário palco-altar da JMJ, ao qual Jesus, o
de Mateus, certamente não subirá.
Dois caminhos: cada qual escolhe o seu. Ocorre-me a mensagem daquela
canção My Way. E a pesada voz de José Régio: “Sei que não
vou por aí”!
17-18.Jun.23
Martins Júnior
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