“Porque hoje é sábado, amanhã domingo”, parafraseando Vinicius, este bilhete postal vai tentar fotografar um outro visual da personalidade de J:Cristo, tanto para aqueles que o cultuam como para aqueles que lhe são indiferentes. O mais importante é o conhecimento, porque só se ama (ou detesta) o que se conhece.
Deixou marcas na sociedade do sé.XX o livro do Prémio Nobel, da Medicina, Alexis Carrel, sob o título “L’Homme, cet inconnu” (O Homem, esse desconhecido) , o mesmo podendo indagar-se de J:Cristo, a cuja temática correspondeu o grande teólogo Juan Macias, redobrando a incógnita na sua obra “Jesus, esse Grande Desconhecido”. Não nos podemos ficar apenas pelos olhos doces, românticos do Nazareno de Ernesto Renan, em “La Vie de Jesus”, nem tão pouco, como bem protestava Guerra Junqueiro, pelo que nos impingem os
“……………………….funâmbulos da Cruz
Que andam pelo universo há mil e tantos anos
Exibindo, explorando o corpo de Jesus”
Nos dois últimos domingos tentei mostrar que um dos aspectos mais vincados da fisionomia de J:Cristo foi o afrontamento radical mútuo entre o seu ideário e os poderes constituídos, o político e, mais ostensivamente, o religioso, inimigos figadais do seu projecto libertador. E porque (já então se impunha subrepticiamente o “Príncipe” de Maquiavel) todos os meios eram legítimos para o único fim --- liquidar a mensagem abatendo o mensageiro --- fariseus, saduceus, sumos-sacerdotes desmultiplicavam-se em estratagemas e armadilhas, quais delas as mais viperinas. Primeiro, foi a questão político-financeira, os impostos. Neste domingo, estamos perante um auto-de-fé, manhosamente urdido. “Qual é o primeiro, o maior mandamento da Lei?”.
Que de peçonha larvar nesta “inocente” pergunta! É que a estratégia libertadora de J:Cristo insistia, até à exaustão, na centralidade da Pessoa vivente, existencial, telúrica mesmo, mais do que na exaltação da Divindade, pois essa não carecia de ser libertada. “Tudo o que fizeres a um destes mais pequeninos é a mim mesmo que o fazeis”. Esta perspectiva antropocêntrica era objecto da polícia do Templo, que mandava espiões por entre a multidão, para acusá-lO de “desestabilizador da sociedade, revolucionário do povo, divisionista da nação” Ele só fala nos marginalizados, come e bebe com eles, os pecadores, até as prostitutas, os coxos, os cegos. A rua era a sua Igreja. E onde estava então o “Primeiro e o Maior mandamento: amar a Deus e adorá-lO ?.”.. Quem ousasse desdizer ou alterar este artigo cimeiro das Tábuas de Moisés seria réu no Sinédrio. Podemos dizer que a Lei Judaica era a própria Inquisição “avant la lettre”. A resposta do Mestre foi lapidar, inapelável:”Esse é o maior, mas o segundo mandamento é-lhe semelhante”, igual, paralelo --- libertar a Pessoa.
Eis a luta, os passos diários de J:Cristo!
Tive o cuidado de pesquisar este afrontamento inexorável e encontrei-o 46 vezes em Mateus, 23 em Marcos, 46 em Lucas e 26 em João, os evangelistas.
É nesta veste que o Mestre se apresentou. Nunca perdeu de vista o horizonte pré-definido e convictamente aceite. Nem se contentou com aplausos, vénias, velas, com devocionismos supérfluos. Ele, penso eu, deve ser, hoje, o mesmo de outrora. Ele quer sair da prisão do sacrário e das douradas custódias em que O meteram. Ele quer que O tirem da cruz onde O amarraram e pregaram os donos do poder e da religião. Ele quer viver e quer para todos “a vida em abundância”.
Vamos procurá-lO: nos caminhos, nas aldeias, nas cidades, nos lutadores anónimos que andam à nossa volta, sem darmos por isso. E vamos descobri-lO, ao menos, hoje naquele lugar de onde há quase dois mil anos esteve ausente: em Roma, em Francisco Papa!
25.Out.14
Martins Jr.
Sem comentários:
Enviar um comentário