Em
chegando ao fim da Semana da Unidade, ficou assente para quem me acompanhou que
o apelo à unidade pressupõe a existência de um vírus exterminador: Por muitos
meandros que se cruzem na história das
religiões e na consciência das pessoas, ou por mais etéreas e sublimes as
emoções, lá estará sempre o factor humano, o deus Leviatão, a dominar o curso dos
acontecimentos até tomar as rédeas do poder e dirigir a carruagem dos tempos. E
é, precisamente, no instinto religioso que ele vai buscar o fogo propulsor da
sua locomotiva. Desde sempre: a entronização, seja ela discreta ou espaventosa,
do faraó no altar dos deuses, até à divinização dos caudilhos, dos fuhrer’s, dos carismáticos soberanos!
Prender numa só mão os dois poderes --- o temporal e o espiritual --- eis o
apogeu da dominação dos povos.
O que anteontem ficou dito acerca da divisão
entre católicos e ortodoxos em 1054, já ocorrera entre 2000 e 1788 A.C., na
tumultuosa transição entre o Antigo e o Médio Império: “O centro da gravidade
política deslocou-se de Mênfis, ao Norte, para Tebas, ao sul; e é por esta
razão que o deus da nova capital do Império, Amon de Tebas, que até então não
era mais que uma insignificante divindade local, se transforma em Amon-Ré, por
estar à altura do seu novo significado político”. É o mesmo autor, Eric
Voegelin; que o afirma na sua obra “As Religiões Políticas” ( proibida desde a
ascensão de Hitler) que o sublinha: ”O colectivismo político não é somente uma
manifestação política e moral: é a sua componente religiosa que me parece muito
mais importante”.
Seja
por onde for que se lhe pegue, a tessitura das rivalidades religiosas nasce e
robustece-se com a auto-cefalia do Poder. Assim, em Inglaterra, com Henrique
VIII, assim com a doutrina galicana em França (lembram-se dos dois papas: um
Roma e outro em Avinhão?), assim em Pequim, na China comunista, onde há duas
igrejas católicas com sacerdotes: ali se prega, ali se reza e se canta em
chinês, mas essa igreja oficial não tem nenhuma ligação com o papa de Roma. Sem
uma escolha dos bispos no próprio país, dificilmente se há-de chegar a um
entendimento em Roma. E sem a aceitação, por Roma, destes três pontos ---
auto-sustentação, auto-administração e auto-difusão da igreja --- não será
possível uma reconciliação entre a igreja oficial e a igreja subterrânea”.
(Hans Kung, Religiões do Mundo).
Propositadamente (decerto já reparastes)
preferi a diacronia dos acontecimentos, justamente para demonstrar
que é pelo pipe-line das religiões
que as ditaduras ou as autonomias musculadas vão abrindo caminho, sem esquecer
que, no mundo ocidental, o cesaropapismo seguiu rumos diversos, após o declínio
do decrépito Império Romano: foram os Papas que impuseram o seu domínio
absoluto na esfera dos dois poderes, o temporal e o espiritual, para escândalo
de toda a Igreja.
É
o movimento circular da História, numa comprometida osmose de interesses
conflituantes que, se bem analisarmos, tem passado por cá até ao momento presente.
Na
Semana da Unidade, com términus a 25 de Janeiro, sirvam estas considerações
para ajudarmos a neutralizar os vírus que minam esse tão desejado sonho
unitário do nosso J:Cristo!
23.Jan.2015
Martins Júnior
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