ADEUS, Ó CARNE!
No seu sentido etimológico, entende-se o Carnaval como a tradução latina de “Caro, Válè”, o mesmo que “Adeus, carne, prazeres do mundo”, porque vai entrar a Quaresma, tempo de jejum e abstinência. Os “Sete Magníficos” maiorais da aldeia, reuniram-se em segredo. Mas o “Senso & Consenso” teve acesso a tão estranho conclave, de onde saíu fumo triste:
Pra dizer adeus à carne
Foi marcada uma assembleia
Oito cardeais de luto
Juntos na última ceia
Antes da quarta das cinzas
Chegaram à “Quinta Vegeia”
Porque o Dono Disto Tudo
Marcou prá noite de Entrudo
Lacrimejantes os velhos
Na mesa do consistório
Eram como almas penadas
Ardendo no purgatório
Com a ementa que lhes deram
Nesse triste refeitório:
No prato dos maiores nossos
Em vez de carne, só ossos
Ninguém queria comer
Torciam cada nariz
Pareciam degradados
Expulsos do seu país
Entrou o DDT
E furioso lhes diz:
Já engordastes demais
Agora adeus carnavais
O mais moço educadinho
Pega logo no seu prato
E vai prá casa de banho
Vomitava como um gato:
“Até aqui comi do lombo
Agora ossos do sindicato
Soluça, bebé chorão,
Adeus minha Educação”
O rapaz de papadinha
Indigitado pra Papa
Pelo vigia da quinta
Vendo-se fora do mapa
Pernas pra que vos quero
Foi depressa e à socapa
Levar ao seu matadouro
O gado do seu pelouro
O geronte brasileiro
Secretário dorminhoco
Acordou pra aquela ceia
E disse “Tá tudo louco
Dei saúde à Região
Agora levo no coco”
E saiu já mortal
Prá morgue do hospital
Encolheu-se na cadeira
O porteiro das Finanças
De tanta carne oferecer
Pra festeiros e festanças
Só lhe deixaram um dente
Carpindo como as crianças:
“Agora é que foi de vez
A funerária Garcês”
Copinho-leite talhado
O vice-rei altaneiro
Saudoso das franganitas
Que vinham ao seu poleiro
Não cantava só gemia
Num estertor derradeiro:
“Emigro prá Catalunha
E meto ao Mas uma cunha”
“Essa é velha, arranja outra”
Disse em tom desagradado
A Sãozinha da espécie
Aracnídeo dourado
Com passaporte e bagagem
Deu um adeus atravessado:
“Cá não perdi tempo nem vista
Arranjei-me co’ um turista”
O que depois se passou
Ninguém sabe nem divisa
O UI foi-se agitando
Pior que a torre de Pisa
Estatelado no chão
Só gritava por Syrisa
E berrava como um bruto:
“Tragam lume e um charuto”
“Ai este palácio-rosa
Que me deixou meu avô
E mais o bispo Santana
Que Noss’Senhor o levou
Saindo daqui prá rua
Mas meu Deus pra onde vou?
Num jardim com tanta pinta
Fico em vigia da Quinta
Mas chegou logo um anão
E pela mão o busico:
“Sei que vendia retretes
E contigo fiquei rico
Deixa a cadeira ao piqueno
Tenho raça de Machico
Se não fazes o que eu mando
Vou-te lixar não sei quando”
Pra acudir ao DDT
Nesta amarga geringonça
Entra um morgado que rima
Com os amigos da onça
DDT viu e ouviu
O vai-treze do Mendonça:
“Vão-me correr da Assembleia
E tu da Quinta Vegeia”
“Deste muita corda larga
Ao teu delfim-traidor
Não te importes, já enchemos
O nosso congelador
Da carne desta vaquinha
A congelada é a melhor
Quinta Vigia de outrora
De Angústias ficaste agora”
E saíram cabisbaixos
Tapados como jihadistas
Cada qual pelo seu beco
Que nenhum desse nas vistas
Nem um pingo do seu pranto
Soubessem os jornalistas
Mas ninguém me leve a mal
Porque hoje é carnaval
17.Fev. 2015
Martins Júnior
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