Em
toda esta nação de Santa Maria não há povo tão madrugador como o do arquipélago da Madeira!
É
o que certamente dirá qualquer visitante, venha ele do continente português ou
fora dele. E tem razão. Quem percorre, de agora
até ao Natal, as cidades e aldeias das nossas ilhas há-de avistar-se com
romarias e cantares, aqui, acolá, mais
além, ininterruptamente, tal como sucede a quem faz uma viagem intercontinental
e vê lá do alto o sol nascente, surgindo à compita na crista de cada fuso
horário percorrido.
A
nossa gente ama o mágico, o secreto sortilégio da aurora que vai nascer. Faz
mesmo lembrar as luminárias de outrora, os ritos inebriantes das eras pagãs,
sobretudo o dies natalis solis invicti
--- “O dia do nascimento do sol invicto”, alusivo ao solstício de inverno e
que terá sido absorvido pelo Natal do Menino. É bonito de se ver o povo na sua estatura
sacro-profana, dando largas à alegria que o liberta de traumas e medos do
quotidiano onde tantas vezes resignadamente vegeta. Já não direi o mesmo quando
à “Missa do Parto”, que virou moda, se atrelam
instituições estranhas à comunidade, perdendo-se aí a típica espontaneidade popular. É saudável e
reconfortante ver a comunidade intacta e
unida no seu respiro matinal.
Mas
seria uma grande pena se os animadores-figurantes do folclore mariano ficassem por aí, no arraial ligeiro de chocalhos e
machetes. Porque a devoção à Senhora do Parto condensa, desde tempos
imemoriais, a intuição e a sensibilidade telúrica de um povo que ama a vida
incarnada num novo “pequeno-grande ser” que nasce sobre a terra. Interpreto
como um poema, quase-epopeia, a saga de quem rasga o ventre materno para pegar
no facho da vida e iluminar a noite escura do planeta. Sem parto não há mundo
nem há vida.
No
humilde templo onde também se festeja a Senhora, chamada do Amparo, é esta a
palavra-passe que vai abrir o computador das nossas mentes durante estas madrugadas.
O Parto ! --- início e meio ecológico onde cada um de nós faz ressurgir e
crescer “a ânsia de subir e a cobiça de transpor”, como triunfalmente cantou Goethe, no seu “Fausto”.
Vamos
reflectir e descobrir que este Planeta é uma imensa e colossal Maternidade onde
todos nós somos parturientes do futuro, criadores do amanhã: somos todos e
simultaneamente dadores e beneficiários, progenitores e herdeiros. A terra
inteira está grávida de sonhos e tesouros que esperam por nós para ver a luz do
dia!
É a nossa essencial homenagem à Senhora e o que Ela de nós mais
espera. E depois, cá fora, o povo
espontaneamente confirmará, com euforia e substância, a alegria natural de
co-participar no renascimento da Vida!
17.Dez.15
Martins Júnior
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