terça-feira, 15 de março de 2016

FOTOSSÍNTESE DA VIAGEM FINAL

Poucas horas faltarão para crer o incrível. Sei do quanto conversávamos sobre a morte. Acompanhá-lo-emos,  desde o necrotério - “já lá vão quatro dias(Jo, 11,17) – até ao átrio do  optado holocausto da cremação, enquanto vou soletrando esta fraterna homenagem para o Ângelo e, se possível, perene bálsamo para a Ana.


                                                                                   
Mais doze pancadas
No mostrador daquela porta
A que chamam câmara morta
E sairão mudas geladas
Canções poemas gargalhadas
Da véspera
Das vésperas  de outrora

Agora
Outra porta te reclama
Onde o gelo se faz chama

E sairão
Aladas crepitantes
Cinzas que dão
Fumo branco
Volutas diamantes
A quem fica nesta margem

Estranha fotossíntese da última viagem:
Contigo vão o moinho a lenha e as ossadas
Connosco deixas
O canto livre das estradas
O voo astral da tua Ideia
A manhã clara das tuas gargalhadas

Que a nossa mão semeará
Até que chegue aquela badalada
De levarmos no saco da bagagem 
As cinzas que nos vestem

De novo o mesmo fumo branco sairá
Na derradeira torre de menagem
Hoje tua – amanhã nossa

Oh portentosa
Estranha fotossíntese da última viagem  

15.Mar.16

Martins Júnior

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