quinta-feira, 31 de março de 2016

NEM UM PAIOL DE PÓLVORA – NEM A SONOLÊNCIA DO CHARCO


“Guerra e Paz” – assim titulou Tolstoi o seu romance histórico. Hoje pego na capa para alterar-lhe  a sequência dos conceitos e formular uma outra dinâmica, inspirada no método científico: PAZ-GUERRA-PAZ, correspondente à clássica gradação: TESE-ANTÍTESE-SÍNTESE.
Embora estranha, à primeira vista,  vem esta equação a propósito do actual momento que Portugal atravessa. Após sucessivos anos de guerrilhas político-partidárias, quase sempre fratricidas, chegámos àquela estação do percurso em que se abandonam as sistémicas trincheiras de combate para retomar energias, de mãos dadas, face ao futuro. É uma nova filosofia de estar e servir o interesse comum. E de tal maneira que este ambiente de co-produtividade sócio-política incomoda  coercivamente aqueles que detinham as rédeas do poder e, na aparência, apresentavam-se como os promotores exclusivos da paz social. Hoje invertem-se os papéis: e é vê-los, os tais, nos parlamentos, nos congressos, ávidos de sangue (“temos de ser mais agressivos”, explodia esta manhã um dos  corifeus); de “bem- amantes”  passam-se a divorciados e rivais no “campo-pequeno” do grande poder.  Esta quase-alucinação atira-se de olhos atravessados, soturnamente estrábicos, quando vêm Presidente da República e Primeiro Ministro a remar para o mesmo porto do interesse da Nação.
Talvez que os mesmos que antes diabolizavam a CGTP e a UGT, quando juntas nas grandes  manif´s, agora fervam de impaciência quando as centrais sindicais parecem ter perdido (aos olhos deles) a vitalidade e o domínio da rua em peso.
Mas tudo não passa de um equívoco. Insanável, para quem assim se agita. Esquecem, sempre os tais, o percurso bio-social do Homem-em-situação, ou seja, a tríplice gradação existencial: PAZ-GUERRA-PAZ. Não se pode viver permanentemente em campo de guerra. Esta só vale como ponte instrumental  para a paz comunitária. Há tempo de resistir ao sono em combate, mas também há tempo de respirar o ar puro e justo que a grei conseguiu pela mão dos seus milícias representativas. Chamo aqui o pensamento de Arendt: “A violência pode destruir o poder, mas da violência nunca poderá nascer o poder”.  Tomo esta análise de filosofia política para, à sua luz, interpretar e medir o alcance de todo o  lugar da agressão, seja em que plano for da actividade humana.
Questionar-me-ão os meus “ímpares” amigos, acusando-me de fazer a apologia do contentamento fugaz, da inércia, enfim do ultra-liberal laissez faire, laissez passer.  A quem o dizem?!  É preciso desconhecer todo um passado (e um presente!) de luta  em que tenho navegado. O que me parece útil e necessário dizer é que um atávico e irresistível “cheiro a pólvora”  ( o termo tem direitos de autor bem conhecido) não segura nem o atirador nem o alvo nem o próprio campo de tiro. Quem assim pensa já está inscrito nas alas do Daesh, como suicida e assassino.
O importante e decisivo é a vigilância contínua. No esclarecimento,  na força motriz do pensamento, na denúncia, na voz, na escrita, nas redes sociais,  em casa e na rua, na escola e na igreja (assim faz o incansável Francisco Papa), no olhar atento e critico sobre as cúpulas do poder. É a isto que chamo o Poder Popular. Os governantes têm de temer (respeitar) os governados.  Nunca ceder um palmo à cobardia, ao jogo sujo de bastidores para salvar a pele. A pele somos todos nós.
Quando a solução única  for a “guerra campal”, a rua ou o assalto, então é sinal que,  no silêncio do oportunismo e da inércia, deixámos que nos amarrassem de pés e mãos. Não há outra estratégia eficaz que não seja a visibilidade coerente e consequente da meta comum, mesmo que por caminhos diversos.  Este é o sítio certo onde estamos e sempre estaremos: a Paz que nos segura, a guerra que nos redime e, de novo, a Paz no topo  da montanha – para depois recomeçar a mesma eterna  jornada, repetida no rotativo curso das gerações.
A vigilância operante de hoje será amanhã  a garantia da “Terra Prometida”.  Que ninguém perca o caminho!

31.Mar.16

         Martins Júnior

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