Quem
diria que hoje seria capaz de equipar-me de farda sabatina e luvas domingueiras
para celebrar, não os futebóis, mas o Futebol?! Nem sequer para agitar bandeiras
em furação nesta noite entre os dois vizinhos da segunda circular. Muito pelo
contrário.
Por
isso, distingo entre Futebol e futebóis. Destes, no plural minúsculo, já me
ocupei o suficiente noutra altura. Considero um atentado às teclas do meu
computador obrigá-las a gemer sob os pitões dos novos gladiadores do século XXI
para enaltecer os malefícios marginais dos futebóis, a corrupção que escondem
nas chuteiras-carteiras dos dirigentes, os canais arbitrários por onde circulam
dinheiros sujos, os correios de droga onde acabam, como infelizes vítimas de um suicídio-a-prazo , grandes “heróis” dos estádios,
enfim e sobretudo, o tráfego de pernas e braços e cabeças que, lá por serem de
ouro milionário, não deixam de ser tráfego legalizado de seres humanos. “Vamos
vender o fulano de tal, vamos comprar o beltrano, trocar o sicrano” – uma linguagem
aviltante, inferior à dos mais baixos contrabandistas de feira!
Hoje
levanto o estandarte do humanismo do Futebol-Desporto-Crescimento sustentado da
personalidade humana. E faço-o convictamente contra os mercados do descarte em
que caíram tantos jovens às mãos de empresas futebolísticas, gigantescas
ventosas de sugar nervos e ossos, triturando-os em máquinas de fazer fortuna e,
depois, atirando-os para o caixote dos resíduos mal cheirosos. Quem conhece os
carburadores destas máquinas sabe de muitos e tantos, outrora levados aos
ombros e depois arrumados nas prateleiras do mais desumano esquecimento.
Por
isso rendo hoje a mais justa homenagem aos dirigentes do clube que teve a honra
de contar no seu plantel com o grande atleta VICENTE LUCAS. Foi ele uma das
glórias da formação do Restelo. Os “ecrãs” e as impressoras não lhes deram a notoriedade que mereciam,
tanto ao defesa central, como ao clube e seus dirigentes. A notícia é tão
lacónica quanto eloquente: “Vicente Lucas, 80 anos, moçambicano, irmão do famoso Matateu e, como
este, ao serviço do FCB, vencedor da Taça de Portugal 59/60, internacional
vinte vezes, ficando memorável a vitória contra o Brasil (1-0) em que foi
mundialmente conhecido como “o homem que meteu Pelé no bolso” - pois,
Vicente foi vítima de gangrena e, por
isso, teve que ser-lhe amputado o pé esquerdo. A direcção do clube tem-lhe dedicado toda a
atenção ao longo deste percurso crítico e, porque
o único filho vivo está a centenas de quilómetros de Lisboa, já escolheu um lar
confortável para o seu inesquecível defesa central”.
Vicente
Lucas deu imensas alegrias aos Belenenses e ao país desportivo.. Aquele pé,
agora amputado, já foi um pé-de-ouro.
Hoje, para muitos que enchem os estádios não passa de uma múmia e menos que
isso. Mas houve alguém que resistiu ao mercado descartável de gente humana e
bradou: “Vicente és nosso… estás vivo… o teu pé inexistente ainda é uma memória
vitoriosa para os verdadeiros amantes do Futebol, em especial para a massa
associativa da Cruz de Belém”!
É
esta a exaltação dos indestrutíveis valores humanos do Futebol e de todo o
verdadeiro Desporto. É esta a voz que sobressai do gesto da direcção e dos amigos do CFB.
Mesmo sonegada da grande e falaciosa comunicação social, essa silenciosa mensagem,
em vida do atleta, fala mais alto que
a paranóia ululante de muitos caldeirões
dos futebóis.
Bem
hajam os seus promotores!
05.Mar.16
Martins Júnior
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