Também pensei ajuntar o subtítulo “A primavera voltou no Outono”. Olhando para os mais novinhos,
até lembram o chilrear da passarada pousando timidamente sobre o chão cinzento
dos pátios escolares.
Será tudo isto e muito mais o que estava anunciado
por toda essa ilha fora, incluindo o
Porto Santo. Um dia grande e um Grande Dia! Quantos de nós sentimos o convite –
e, mais que convite, o apelo – de demorar o nosso olhar, pouco que fosse, diante
dessa revoada saltitante de milhares de crianças, adolescentes e jovens (
48.000, dizem as estatísticas) e apreender-lhe o imenso mundo circular que se
esconde por detrás da ribalta do palco aberto deste 19 de Setembro?!...
Certamente milhares ou milhões ficarão presos, hoje à noite, nos estádios de luz e sombras dos televisores, devorando avidamente
os volteios e rodeios do esférico de couro que não tem sentimentos nem autonomia. Mas o dia de hoje é maior, mais belo, mais emotivo
que as piruetas fugazes de uma hora e meia de entretenimento. Chamo-lhe DIA DE
ANO NOVO NA MADEIRA! Porque é todo o
mundo, é toda a história do amanhã, é toda a vida que recomeça. E re-começar é partir de novo, com
redobrado ânimo e sobredourada esperança no futuro.
Abeiro-me do varandim que
dá para aquela escola – quando digo aquela escola quero dizer todas as escolas.
E fico expectante com um misto de sonho em chama e, ao mesmo tempo, de
arrepiante pavor de mergulhar naquele lago dos novos inquilinos que ali chegam.
Corajosamente seguro-me no parapeito do
terraço e que vejo eu?
Naquelas crianças buliçosas toco a
candura da flor que se abre ao sol… leio os cromossomas hereditários dos
progenitores… deparo-me com as arestas assimétricas da sociedade, com as
carências congénitas de umas famílias e os
saudáveis ambientes de outras… consigo lobrigar
a ingenuidade pura dos infantis caloiros e os instintos desviantes de “veteranos”,
prontos a envenenar o ar que os incautos
respiram… entontece-me a vista e o cérebro ver aquela babilónia desigual em
turbilhão massificado… o transplante de “bebés” arrancados à família e à sua
anterior sala de aula que ficou vazia…
incomoda-me a sensibilidade (ou a falta dela) de pais e responsáveis que vêem
na reabertura do ano lectivo o alívio de quem entra em férias domésticas… E à
pergunta “que vão ali fazer aqueles milhares de seres humanos?”, adivinhar o eco
imediato da resposta: “estão ali para aprender o Código da Grande Estrada da Vida”… Tudo isto
me faz entender que estou (estamos) perante o “macrocosmos” da história do
futuro. Tratados de sociologia, hereditariedade, economia, psicanálise, pedagogia,
história de civilizações --- está tudo
ali!
E como reagem os adultos
perante a vastidão e complexidade deste caleidoscópio humano ? – eis o meu maior
pesadelo. Chega o “dono” do prédio, (chamam-lhe secretário) enfatuado de proa e
com ar afivelado, espera as ensaiadas
palmas dos seus “feitores” e, sem uma nesga de sensibilidade, passa sobre todo
este campo de flores, como um tractor sobre calhaus amorfos. E manda, austero, corta salas, desertifica os centros rurais, divide
cabeças de alunos pelo coeficiente compulsivo de cabeças de tais ou quais professores,
encaixota-os em armazéns superlotados, impõe programas descarnados, talhados nos
subterrâneos da vida concreta e, por fim, obriga professores ( também eles,
pais e mães) a formatar flores primaveris até fazê-las autómatas, máquinas de calcular, sem
alegria, sem autonomia, sem saúde global.
O que trago escrito no
parágrafo anterior pode (e deve!)
encontrar, de uma forma explícita e mais impressiva, em artigo publicado no “Funchal-Notícias”,
da autoria do Prof. André Escórcio. Aí, numa linguagem que só fala quem “tem um saber de experiência feito”,
encontrará um repositório exaustivo sobre a renovação necessária de todo o
sistema educativo. Obrigado, Professor!
No entanto, hoje é dia de
festa e o sol nasce na fímbria do horizonte.
Mas a festa só haverá quando interiorizarmos nós, os adultos, a verdadeira semântica do primeiro dia da
reabertura das aulas.. Ela é maior e, de longe, mais determinativa que os fogos
fátuos dos foguetes que rompem a noite de São Silvestre. Para toda a comunidade escolar, votos
infinitos de empenho e amor à Nobre Causa de erguer Homens e Mulheres do
amanhã!
Por isso, para a construção do Futuro que sonhámos, escrevo – e repito - HOJE É DIA DE ANO NOVO NA
MADEIRA.
19.Set.16
Martins Júnior
Martins Júnior
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