Quem
poderá ficar mudo e quedo perante o retalhar de uma comunidade inteira,
consequência directa do êxodo dos seus filhos na mais tenra idade? E como
deixar impunes os talhantes avaros que, a troco de meia dúzia de cifras, pegam
nas crianças e, logo nos primeiros passos da vida escolar, as obrigam a deixar mais deserta a casa-mãe
onde foram nadas e criadas?!
Nas vésperas do início das aulas, outra
preocupação maior não terá quem vive no
seio desse agregado populacional e lhe sente os problemas familiares, afectivos,
sociais. Por isso, não me cansarei de
afrontar publicamente ( porque de reunir
e conversar já estamos fartos) este insensível governo regional que usa e abusa do que mais de sagrado tem um
povo: o ensino, a educação, a cultura. A frieza e o à-vontade do adejar de
braços com que trata as pessoas como números, não pode passar impune no
julgamento da história.
Professores – são números. É só cortar.
“Só me deram este punhado de docentes – dizem mecanicamente as comparsas do talho, directoras escolares ou algo que o valho. “É
com estes que tenho de dividir os alunos”.
Alunos – números são, os mais frágeis,
quando deviam ser respeitados como elos mais fortes da cadeia educativa. É
medir, talhar, encaixotar e “sigam à minha frente”.
Pais e encarregados de educação -
números também, voluntários à força. Roça a mais vil hipocrisia dizer-se – como
já sei a cartilha – que as directoras
reuniram com os pais e com as crianças. Como se não soubéssemos o papel
manipulador da directora: “são ordens que recebi do sr. secretário”. E o
secretário faz eco: “São ordens que recebi do presidente do governo” ou de um secretário, sempre em transe, de olhar ausente no dinheiro sempre
presente. Lembra isto o ferrugento veio de transmissão hierárquica dos antigos
regimes: O secretário é obediente cego ao presidente e a directora é obedientíssima interesseira (e ambiciosa!) ao
secretário. Quem paga? … As crianças, os mais fracos.
Há uma deficiência, para não dizer perversão,
de fundo: reduzir a escola a quatro paredes de armazém onde arrumar cabeças.
Não entendem nem sentem os talhantes que a escola é um dos maiores antídotos contra a desertificação
rural. E que, por isso, vale tudo defendê-la. Ponham num dos pratos da balança os malefícios da
desertificação e, no outro, os custos de
um professor ou de uma turma. Depois, façam as contas. E respondam-me, se
souberem: quanto pesaria no orçamento regional a colocação de mais um professor
nesta ou naquela escola que pretendem fundir e aniquilar?... Bastaria esquecer
meia dúzia de balonas do fogo de artifício e ficaríamos todos a ganhar. Quem dá
por falta de meia-dúzia de bombas de fim-de-ano? Ninguém. Sabem quantos dão por
falta de uma escola ou de uma turma que dissolvem? Toda a comunidade.
Perguntar-me-ão por que circunstância
inédita trago hoje, mais uma vez, este tema à liça. Pois eu digo-vos: Fiquei
intimamente tocado e intensamente galvanizado com a decisão que ontem anunciou
o Presidente da Câmara da Sertã, a qual é tão sintética quanto eloquente: a
edilidade do município vai inscrever no orçamento de 2017 a verba de 200.000
euros para manter em funcionamento quatro turmas em risco de dissolução numa
das freguesias daquele concelho do distrito de Coimbra.
Tem
muitos e distintos contornos esta notícia, mas o que dignifica e exalta o
município da Sertã é a justificação expressa da medida adoptada: impedir a
desertificação daquela área. A isto chama-se mentalidade superior,
sensibilidade inteligente, numa palavra, a isto chama-se autêntica Autonomia do Poder Local, ao
serviço dos seus constituintes.
Este problema que, como eiró entre o
lodo da maré, enrola-se primeiro como fusão administrativa até desovar na
dissolução da primitiva escola, não pode
ficar por aqui. Quer se ganhe ou se perca este debate-combate, é dever nosso denunciar, como já o fiz
anteriormente, que enquanto os incêndios destroem as serras
os incendiários do governo ardem as escolas. E desertificam os nossos campos.
UM VOTO: que os autarcas madeirenses
sigam o município da Sertã.
03.Set.16
Martins
Júnior
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