Múmias – em
vez de estátuas – era o que pediam as teclas do computador, visto ter sido
condenado o “5 de Outubro” à vala comum, de onde saíu agora, após três anos de
hibernação, igual aos outros 365 sem rosto. Preferi chamar-lhes “estátuas” a
todas as datas sebastianistas que dão
pelo desejado nome de feriados nacionais. No entanto, apus-lhe os qualificativos “mudas
e frias”. Porque é assim que elas ficam
quase sempre no subconsciente das
tradições, sem que a grande porção dos utentes se interesse minimamente em perscrutar-lhes a raiz e os frutos. Por
isso, aí ficam embalsamadas no “congelador do passado”. Até que toquem as sinetas oficiais para saírem
à rua em palanques vistosos e elas, não menos vistosas, vestidas de lantejoulas
verbais que saem dos discursos de encomenda.
O Povo – a turbamulta
dos beneficiários – esse dispersa-se pela praia soalheira, como a de hoje em
todo o território nacional, ou pelos trilhos das montanhas ou, a grande mole, pelo formigueiro dos corredores dos centros comerciais. Mas, que lugar ocupa então o “5 de Outubro” no “animus” dos portugueses neste dia que é
seu, “somente seu” e de nenhum outro país?... Que lhes sobe ao pensamento
quando o despertador adormece e se esquece de acordá-los, como no ano transacto,
chamando-os ao trabalho?...E o fim de um dia de mais saúde física e
psicológica, quem ousa perguntar a quem devem esta folga?... Ao governo da coligação,
não, porque já ultrapassou os cem anos a sua longevidade. Do céu também não
desceu. Do acaso, muito menos.
Tantas
palavras para chegar a uma conclusão, tão clara e única como esta: Alguém,
gente como nós, arrancou do calendário a folha esquálida e disforme em que os
portugueses, mirrados de abandono, apodreciam – e em seu lugar plantou o verde
de uma árvore, regada com o sangue anónimo de toda população sofrida. Mais
forte e vermelho foi o daqueles que tudo arriscaram para que o Povo Português
deixasse de ser manta esfarrapada sob os pés de uma só família - o Monarca - e
se tornasse bandeira verde-rubra flutuando sobre todo o azul do Mar Português,
como expressão da Liberdade, Igualdade e Fraternidade comum aos países
civilizados da Europa e do Mundo.
Necessário
e útil será a pedagogia das escolas assinalar aos jovens os nomes, as passadas
espinhosas, sangrentas até, de quantos fizeram a transição entre a Monarquia e
a República, para nos identificarmos e saborearmos este dia memorável.
E a nós,
adultos, compete-nos segurar o “5 de Outubro”. Porque sempre houve e sempre
haverá um “5 de Outubro” – quer no “1º
de Dezembro” de 1640, quer no “25 de Abril” de 1974. E em qualquer esquina da história
futura. Porque os genes da repressão e da ditadura, ínsitos num esconso
labirinto do crânio humano, estão sempre em potência à espera da sua
oportunidade. E ela surge quando nós adormecemos e acomodamo-nos.
Ser
patriota é estar vigilante. Não o bajulado lamber da bandeira como a raposa à
espera do bago de prata que cai dos anéis dos governantes. Deles falou e
caricaturou Eça de Queirós, quando os
remeteu para o caixote dos “patriotaças, patrioteiros e patriotarrecas”. Mas daquele amor pátrio que se traduz na
vigilância inteligente aos rumos do nosso país, do nosso concelho, da nossa
freguesia, do nosso sítio. Na escola, na oficina, no campo, na fábrica, no
escritório, na rua.
Por outras
palavras, foi essa mensagem do Prof. Rebelo de Sousa, Presidente da República
no seu discurso, conciso e incisivo, deste “5 de Outubro”. Para que não seja
mais uma estátua muda e fria, mas se alevante como o corpo vivo da alma de
Portugal!
05.Out.16
Martins Júnior
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