Ao
fim de um domingo de festas, cortejos, espectáculos, campeonatos, se ainda houver
um recanto íntimo de onde se possa visionar a agitação dos factos e deles
extrair uma cabal interpretação, aqui vos deixo uma proposta.
É
de palmas e de tenras folhagens verdes que me rodeio e inspiro. Porque hoje é o
seu dia – o Domingo de Ramos, um momento
episódico passado lá longe num tempo e num espaço fora do nosso alcance e que
se tornou viral, espectacular, explorado ao sabor de interesses que não foram
os originais.
Situando-nos no cenário de então e
compulsando os escritos coevos, o caso é simples de contar. Um homem de trinta
e três anos, líder e educador de uma espiritualidade transparente – O Mestre J:Cristo – tinha a
absoluta certeza de que os seus dias estavam por um fio. As classes dominadoras
da finança e os intocáveis ‘gurus’ da religião oficial ultimavam as linhas
estratégicas para liquidá-lO. Os rumores e as ameaças verbais que, de
veladas passaram ostensivamente a provocações directas, não deixavam margem
para dúvida.. “Ele deixou de aparecer tão abertamente em público”, dizem os
textos. Armas e exércitos não os tinha, poder financeiro muito menos, aliados
nas altas esferas oficiais também não. Mas era preciso fazer tremer as
estruturas do poder maquiavélico que dominava a Palestina e que maquinava assassiná-lO.
Uma ideia avassaladora saiu do povo miúdo,
à qual Ele, pela primeira e única vez, deu assentimento. E foi num domingo,
pela manhã. Andou a mensagem de boca em boca (hoje seria pela net) e depressa
juntou-se a multidão vinda dos quatro pontos cardeais da Judeia, numa explosão
de alegria que mais parecia um ‘tsunami’ imparável sobre a cidade capital, Jerusalém.
Espontaneamente, velhos e novos, homens e mulheres, crianças saltitantes,
atapetavam o chão dos caminhos com mantos e mantilhas, ramos verdes, o que
havia à mão. A meio da multidão, Ele seguia, manso e firme. Seu trono era um
jumentinho emprestado por um vizinho de uma aldeia próxima. Os manifestantes
enchiam a cidade de vivas, hossanas e
cantares ao seu Mestre e Líder. No seu íntimo (assim me pareço ouvir) um
desabafo pairava desafiando os poderosos: ‘Vós tendes exércitos, carros de
combate, palácios, tesouros. Não tenho onde reclinar a cabeça, mas sou mais
forte que todos vós, a minha força é este Povo que vós explorais
impiedosamente, mas que hoje sai à rua, unido, vitorioso e livre’. Dizem os textos que a
cidade tremeu “alvoroçou-se”. E com ela, os fariseus, os Pilatos, os Herodes,
os sumos-sacerdotes Anás e Caifás. Nem
as sentinelas pretorianas, nem o exército romano, nem os guardas do Templo,
ninguém Lhe tocou. “Com medo do Povo” explica
o relato bíblico. E quando enviaram emissários para que mandasse calar e dispersar aquela gente, Ele
respondeu com o vigor desafiante da sua palavra: “Se eles se calarem,
levantar-se-ão contra vós as pedras da calçada”
E
foi a Festa da Liberdade, foi o poder do Povo, que venceu a ditadura
sacro-profana de Jerusalém! Foi o Dia Ímpar! Não falta, por aí, quem
malevolamente alcunhe Cristo de “Populista”. Nada mais falso. Ele incarnava
todo o Povo e transportava-o aos ombros. Era o sublime escravo do Povo para
salvá-lo em toda a plenitude.
A
quem me acompanha nesta viagem, proponho um simples exercício de comparação.
Que estranho paralelo! Tão diversa a
paisagem, tão contraditória! Dignitários religiosos revestidos de capas
bordadas a filigrana, altas patentes governamentais e militares (vi eu hoje
pela TV, no monumento da Batalha), tudo formalista, artificioso, senão mesmo
embusteiro. Domingo de Ramos não é festa para sumidades eclesiásticas nem para os
brasonados ‘quarteleiros’ dos paióis. Pelo contrário: foi contra os corifeus da
religião oficial e contra os imperadores das armas que o Povo se manifestou, ao lado do seu
Mestre.
Em
Domingo de Ramos, é Cristo o Protagonista --- e seu co-protagonista o Povo
autêntico, a caminho da libertação. E sempre
que um Povo se une e se manifesta em defesa da Verdade e da Justiça, aí se
renova o Domingo de Palmas!
09.Abr.17
Martins Júnior
Sem comentários:
Enviar um comentário