Não me sai da vista e da medula
aquela multidão de escravos judeus a caminho da liberdade, atravessando a vau o ‘Mar Vermelho’ – da cor
das algas submersas. Por isso, aqui vai este sopro que tanto pode ser de
elegia, fúria ou grito de esperança
Adeus terras do Egipto
Onde ficaram
Quarenta anos a ferros
E mil vezes quarenta ‘nilos’ de
escravidão
Muralhas de pedra d’água
Abri-vos em cachão
Que aqui passa Israel
O eleito de Iahveh
Ontem cinza hoje de pé
Pousados na outra margem
Viram os nossos olhos
Cavalo e cavaleiro
Sepultados nesse mar
Onde passámos primeiro
Em sal e pó
Desfez-se o império faraó
………………………………
Senhor
Hoje o mar é vermelho
Não das algas mas do sangue
Que os nossos corpos deixaram
Nas quilhas das barcas de pinho
Covas do fundo marinho
Já não há muralhas de água
Senão monstros de mil fauces
Armas drogas
petro-cheques
Devorando o leite materno
Engolindo mães e filhos
Nos mercados subterrâneos
Que traficam sonhos
ossos veias crânios
O mar avaro avança
Alaga os campos e as praças
Ergue muros farpados bidonvilles
Senta-se à mesa tísica do chão
Onde não há talheres nem taças
Só o podre da prisão
Quem aí vivendo
morre
Jamais cantou ou cantará
Iahveh Hallelluiá
Todo o planeta é vermelho
Não há cravos algas ou manhãs
De uma Páscoa anunciada
Só assad’s erdogan’s
Moab’s trump’s,
kim’s e putin´s
Porquê Senhor
Não regaste os cardos do Calvário
Com o champanhe que corre nas
entranhas
Dos sumos-sacerdotes ?
Porquê Senhor
Só sangue de inocentes serve
Para irrigar montanhas ?
PERDÃO
Senhor
Por não contar contigo
Ver-Te por aqui
Na gávea do terror
Eu não consigo
Nem mandarás Moisés
Enxugar as lágrimas do mundo
Chagas de avós sangue de bebés
A sua vara não mudará o nosso
luto
Nem atravessaremos o mar
A pé enxuto
Nem Tu o conseguiste
Desde essa tarde negra e triste
Da colina redentora
A Páscoa será duradoura
Se for nossa
Quanto queira tanto possa
A força dos braços abertos
Para a luta e para a paz
A Terra da Promissão
Só a alcança
Quem esconjura os fantasmas
Da servidão
Nunca será inteira
Mas de cada Sexta-feira
Faremos o Domingo
De toda a libertação
17.Abr.17
Martins
Júnior
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