Aconteceu
em 5 e 6 de Janeiro e teve por cenário a evocação das embaixadas reais lá dos
lados do Oriente.
Fosse o Príncipe de Gales e a diva Rainha - e logo se lhes rendiam os
holofotes-satélites, as ondas gravitacionais e as rotativas da “Última Hora”
para dar a grande notícia: “Enquanto a Rainha fazia a última viagem sem retorno,
o Rei dava o último suspiro no seu leito da morte”.
Mas não foram os monarcas da ‘Velha
Albion’. Nem os protagonistas das emotivas construções romanescas de
Roberto Machim e Ana d'Arfet. Nem os
arroubos clangorosos de “Tristão e Isolda”, imortalizados pelo génio de Richard
Wagner. Não. O acontecimento resume-se em duas palavras, para nós ricas de
interioridade, mas vulgares, talvez inúteis, para o vasto mundo: “Morreram
marido e mulher. Ambos com 92 anos. Ela sepultou-se no dia 5, véspera dos “Reis”
e ele no dia 6”.
Devo dizer que, em 56 anos de exercício
sacerdotal, nunca tal me acontecera. E enquanto soava a finados o carrilhão da
torre sineira e a carrinha (de todos nós) deslizava rumo ao ‘Campo Santo’ final,
ia eu rememorando o “Noivado do Sepulcro” de Soares de Passos…
Fossem quais as causas e as
circunstâncias, não é possível olhar com fria indiferença para este quadro
dramático e, simultaneamente, galvanizador. Gente rural, corpos quase
centenares, curvados sobre a terra para dela surgir o pão. Mãos calejadas,
retalhadas e dentro delas segurando um coração sempre novo de amados e amantes,
ao ponto de ‘marcarem partida’ na mesma semana, a Semana dos ‘Reis’.
Gente
rural, Gente Real, que fabrica o pão e a vida, de que todos nós participamos e
sem os quais fenece, inglória. a nossa própria história individual e colectiva.
Gente Real, cujos filhos os mantiveram sempre na sua casa singela, o seu
palácio ideal. Gente Real, ainda, porque ambos cumpriram ampla e generosamente,
o seu mandato terreal e transportam consigo o ceptro da vitória!
Requeiro,
neste momento, a permissão de quem me lê para partilhar a emoção que envolveu
esta entrada triunfal dos dois nonagenários na misteriosa alameda do
além-túmulo, munidos do passaporte que lhes dá direito a ocupar um trono real,
esteja ele onde estiver. E ele está aqui. Connosco. Por isso posso proclamar na
oitava dos ‘Reis’ e no mais alto monte o pregão monumental, aposto ao épico
poema de Dante Alighieri:
“REI
E RAINHA, LADO A LADO E DE MÃOS DADAS, NA GRANDE VIAGEM SEM RETORNO! HALLELUIAH”!
07.Ja.18
Martins Júnior
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