Embarcados
já na jangada livre que dá pelo nome da britânica silly season, instintivamente
desligamo-nos das árduas tarefas do quotidiano exame judicativo dos factos circundantes.
No entanto, não podemos passar ao largo daquela labiríntica gruta tailandesa
sem lhe deixar nas paredes pré-históricas alguns traços da sinalética humana que a todos nos toca.
O
primeiro toque a entrar no meu subconsciente é a homenagem que intimamente
sinto crescer dentro de mim por todos aqueles e aquelas – professores,
educadores, animadores sociais – que ganham
coragem para acompanhar grupos de jovens e crianças em digressões
lúdico-culturais por esse país fora. Quem já passou por aí, sabe a soma de
fadigas, preocupações e até sobressaltos supervenientes, alguns de todo
inimagináveis na programação cuidadosamente elaborada. Se não fora um mandato
interior de quase-missão e amor à causa dos mais jovens, dir-se-ia uma
insensata falta de bom gosto e bom senso sacrificar um merecido tempo de
férias em troca da constante vigilância,
supervisão e atendimento a cada caso, isto é, a cada elemento do grupo. Daí, a
minha homenagem.
O
segundo aviso (válido para todos os percursos e todas circunstâncias da vida) é
o cálculo do risco. Sem querer entrar em terreno tão perigoso como o das
cavernas de Chiang Rai, não
estarei fora da linha do horizonte lógico se disser que em grande parte dos
casos, é o aventureirismo “que comanda as vidas”, os trilhos, as caminhadas, como
mês-por-mês se tem registado nas levadas da Madeira. Percursos sinuosos e
abissais estão proficientemente assinalados e, no entanto, os ‘estranjas’, muitos
deles na terceira idade, atiram-se “de olhos fechados” para as funduras mais
inóspitas. E assim como a mítica Tailândia ficou negativamente marcada nos
mapas turísticos, assim a Madeira sai enlameada destes episódios fatídicos ao
longo das levadas. Culpam-se os governos, as autarquias, os organismos
oficiais, quando afinal o que faz e fez falta é o cálculo do risco. Por isso
que. aliada à homenagem descrita no parágrafo anterior, recomenda-se aos
guias-professores um rigoroso estudo do meio e do risco para o bom sucesso das
excursões pedestres.
Um
terceiro e não menos importante sinalizador encontrei-o num artigo da imprensa local,
que insolentemente pretendia provar a
existência de Deus por ter salvo os 11 adolescentes e o respectivo treinador.
Classifiquei de insolente a pretensão. Direi mesmo blasfema e lesa-divindade !... a não ser que me respondam a este
dilema: Deus existe, porque estes se salvaram. E Deus, onde é que Ele estava e
onde é que Ele existe quando deixou morrer um heróico e experiente mergulhador,
já aposentado, que se voluntariou para ajudar o grupo?...Seguindo a mesma lógica,
esta morte provaria a inexistência de Deus. Não se chame nem se invoque em vão
o Seu nome É esta mentalidade atávica que origina psicoses doentias e provoca o
retrocesso civilizacional nos povos.
Quem
operou a salvação dos jovens foi o Ser Humano, o seu inquebrável denodo, a sua generosidade, o amor à Vida – à sua e à dos jovens. E, no
mesmo plano, o “milagre” da tecnologia, fruto da inteligência e do trabalho do
Homem. É essa a maior glória do Criador: a autonomia da sua criatura!
Se
é o Homem que faz o perigo, é ao próprio Homem que compete eliminá-lo.
11.Jul.18
Martins Júnior
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