Que
mais resta da Madeira neste intermezzo
trópico de Julho a Agosto? Jardim de flores, não, porque as crestou a
canícula de estio. Mar e praia, serra e sombra, talvez só para aqueles que da lei da estouro se vão libertando. Que resta
então?
Hoje
por hoje e por todos os poros, a ilha é a caixa de Pandora de todos os metais,
a grafonola gigante de todos os acordes. Talvez a compare ao “barco do amor” vagante ou, com maior
propriedade, será ela o novo Titanic em
cujo bojo, do convés a todos os salões, orquestras de néon destilam bombadas de espuma etílica com ‘alzheimer´ à mistura.
Experimentem
desenhar um pequeno poliedro e ponham em cada face uma vila, uma cidade, uma aldeia deste basalto
de 600 anos. E logo ficará cheio, a rebentar pelas costuras: são os medonhos
decibéis, são os campanudos percussores, são as caldeiradas-peixeiradas do
bacalhau da outra, são as lagartixas de plástico a secar por entre a cruz das
caravelas, são sempre, quase sempre os notáveis importados de aquém e além
fronteiras, alguns até tatuados de ‘summer opening’ para estrangeirar o burgo.
Há as anafadas sessões de gastro regional com salpicos de moscas parideiras
e ainda o incenso das novenas, os
anjinhos da procissão e os foguetes, ai o fogo sagrado que não pode faltar para acabar de atordoar os neurónios de
populações escassas de amor e carentes de pão.
Desenhado
e embutido o poliedro com tanta algazarra sem freio, pergunto ao seu autor: E o
Povo, onde me dá aí um sinal de Povo?
Onde me aponta o traço criador do
Povo, senhor da sua terra e da sua festa? Que credenciais ou mesmo modesto distintivo
da idiossincrasia daquela gente que paga a festa e oferece a sua ‘sala nobre’
para quem vem de fora?
Fica
a pergunta – um ligeiro drone sobrevoando
a ruidosa ilha à procura de resposta. Que nunca virá, talvez… A paranóia dos
arraiais está feita para despersonalizar a alma genuína das gentes locais. Sob
a pílula de um dourado desanuviamento, ficam as populações longe do núcleo gerador
da sua festa – a estratégica
oportunidade (essa, sim, de ouro puro) para mostrar as virtualidades endémicas,
a sua sensibilidade original através da sua poesia, da sua dança e da sua
música. Em muitos casos, as festas mais se parecem com os rituais de corpo
presente e alma ausente.
Por
mim, dava tudo ou quase tudo para ver o Povo ocupando, de direito e de facto, a
centralidade das suas festas!
Enquanto
isso, vou trauteando a canção que por aqui continuamos a cantar:
Na festa que o Povo
organiza
Há mais alegria e
verdade
Por isso trazemos a
estrela
A estrela da
felicidade”
27.Jul.18
Martins Júnior
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