domingo, 23 de setembro de 2018

CORRUPÇÃO DE MINISTRO


                                                                      

       Antes que o domingo se fine, há-de sobrar um sopro de  brisa outonal que nos traga um recado longínquo, mas tão vivo e actual como o ar que respiramos. O recado mexe connosco, remexe as folhas do dicionário que nos deixaram os mestres da língua de Camões e vai radicar-se nos primórdios da nossa ancestralidade falante.
         Concretamente, dirijo-me às fontes do nosso idioma e lá descubro algo de tão surpreendente quanto contraditório: o vocábulo servo (criado, assalariado, servente ou servidor) provém da nossa matriz latina e é designado ou traduzido pelo substantivo comum minister=ministro. Por onde se conclui que só merece o título de ministro  ou, por maioria de razão, de primeiro-ministro aquele que melhor serve o seu patrão, o seu dono e senhor.
         O longo e sinuoso iter de um simples vocábulo! Como foi possível uma tão distorcida corruptela da linguagem corrente, a deturpação dos conteúdos funcionais originários, ao ponto de arvorar-se em juba de leão aquilo que era entrega humilde das mãos, da mente e do corpo de um servidor escravo ?!... A cerviz curvada à relha do arado deu lugar ao cadeirão palaciano do ministério altivo. As mãos calejadas, mal cheirosas no arreio das cavalariças do amo armaram-se em plumas de ganância escoltadas por baionetas feitas do vil metal que compra as consciências!
         Almeida Garrett, já em 1845, interrogava-se sobre quantos pobres seriam necessários para fazer um rico, subentendendo, ainda, o aguerrido desafio acerca de quantos embustes, falácias, traições precisaria um candidato para alcançar a poltrona de ministro, governador, presidente, “chefe da manada”. Mas o que mais confrange e revolta é ver o incompetente, o ignaro, o sabujo, em lá chegando, nomear outros tantos incompetentes, ignaros e corcundas de carácter para ocupar os centros de decisão de uma comunidade!
         Atravessa todas as coutadas e quadrantes, nacionais, regionais, locais, este vírus corrosivo. Até as próprias instituições, ditas espiritualistas, sacras e afins.. Quanta hipocrisia, quanto calculismo ao serviço do oportunismo eclesiástico, para ‘ascender’ ao barrete episcopal ou travestir-se da púrpura cardinalícia! Até se vangloriam e  exigem ser chamados ministros de um deus fundido e moldado à sua maneira! Posso afirmá-lo pelo experienciar dos dias e confirmo-o com o texto deste domingo, o de Marcos, 9, 30-34. Quando os Doze discutiam entre si qual deles seria o maior, o Mestre – Pedagogo e severamente crítico – cominou-os com esta solene reprimenda: Aquele, de entre vós, que quiser ser o primeiro seja o último e aquele que pretender ser o maior seja o vosso servo, o vosso ‘minister’.
         Um Voto, o único que interessa ao país e ao mundo: Que o Ministro, o Presidente, o Secretário, enfim, o Chefe regressem às origens da sua identidade e assumam-se, de corpo e alma, como verdadeiros Servos do Povo! Assim faz  Francisco Papa: a autoridade mostra-se no serviço.

         23.Set.18
Martins Júnior
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