Está
na ordem do dia o grande dilema com que se debate a ciência da comunicação. De
um lado, a imprensa e o audiovisual estandardizados, com os seus códigos, a sua
formatação e conteúdos arvorados em dogmas a que todos devemos tributo. Do
outro lado, a invasão das redes sociais, as quais se atiram como abutres
devoradores dos cérebros, das emoções e das sociedades.
Neste
combate desigual há vencedores e vencidos. Entre os vencidos jazem caídos na
choça, ou quase nela, os meios tradicionais de comunicação, os quais vêem
tremer os alicerces da sua hegemonia gratuitamente herdada desde tempos imemoriais,
enquanto do outro lado da barricada campeiam e pavoneiam-se os twitter´s, os
instragam´s e afins, cujo potencial bélico arrasa tudo à sua passagem. Veja-se
a vitória do ditador Bolsonaro e do “vilão” Trump. Lamentavelmente a imprensa e
o audiovisual, numa tentativa ilusória de sobrevivência, deixam-se resvalar na promíscua
miragem .dos seus rivais, servindo ao público o mesmo produto inquinado, o
sensacionalismo soez, os escândalos sociais, sexuais e vicinais, as intermináveis
mesas desportivas, tão redondas e ocas como a bola que discutem. Chega a ser
deplorável, nauseabundo o antro em que vegetam certos conteúdos e certos
centros emissores,
Entretanto,
no meio pantanoso em que se afundam os habituais programas, fomos ontem
surpreendidos por um lampejo de coerência e lucidez no visionamento de “PRÓS&CONTRAS”,
onde Fátima Campos Ferreira teve a coragem de trazer para a ribalta da nação o mundo tormentoso
que percorre os subterrâneos da sociedade e que nós, intencionalmente ou não,
tratamos de esconder como um tabu.
Expôs-se
ali em palco e ‘ao vivo´ o drama dos CUIDADORES INFORMAIS. Pais que cuidam de
um, dois e três filhos vítimas de paralisia infantil. Filhos que desistem do
seu futuro profissional para tratar de um pai ou de uma mãe atacados de
esquizofrenia. Uma esposa que tudo deixou para assistir, vinte e quatro horas
sobre vinte e quatro horas, ao marido idoso, vítima de esclerose múltipla.
Ninguém que visse o programa terá ficado de coração enxuto, ao percorrer esse cortejo
pré-fúnebre que diante dos nossos olhos se foi desenrolando.
Só
me ocorria ao subconsciente o sentido poema de Gomes Leal - a “Senhora Duquesa de Brabante” diante do
filho “raquítico, enfezado, excepcional, todo disforme, malquisto”. Quando o “monstro” morreu houve festa no
palácio, arraiais na ruas, o próprio pai ria às gargalhadas. Mas…
Só, sobre o esquife do
disforme morto,
Chora, sem trégua, a
mísera mulher
Chama os nomes mais
ternos ao aborto
Mesmo assim feio, a
triste mãe o quer
Mas
naquele plenário familiar (todos, desde o ecrã até ao nosso divã, todos nos sentíamos
irmãos da mesma família) o que mais me sobressaltou não foi pranto nem desespero, mas a capacidade de
resistência, “mais do que prometia a força humana”, daqueles cuidadores, quase todas mulheres, de
fronte erguida, sofrido sorriso no olhar, frescura estóica no rosto, expondo
sem complexos os seus dramas e exigindo acompanhamento e apoios adequados por
parte de quem governa .
E
foi precisamente este valor mais alto – o da consistência psíquica de amar e
resistir que motivou hoje o nosso “Senso&Consenso. Não. por masoquismo
ou comiseração. Ver para crer. E querer. E agir. Poucas vezes se viu na TV um testemunho
tão eloquente e mobilizador.
Por
este Parlamento Maior do sofrimento humano, ou, como diz o Papa Francisco, por
este superior “Hospital de Campanha”, na televisão pública, as minhas
saudações!
13.Nov.18
Martins Júnior
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