terça-feira, 13 de novembro de 2018

PLENÁRIO NACIONAL DO SOFRIMENTO E DA RESISTÊNCIA


                                                            

Está na ordem do dia o grande dilema com que se debate a ciência da comunicação. De um lado, a imprensa e o audiovisual estandardizados, com os seus códigos, a sua formatação e conteúdos arvorados em dogmas a que todos devemos tributo. Do outro lado, a invasão das redes sociais, as quais se atiram como abutres devoradores dos cérebros, das emoções e das sociedades.
Neste combate desigual há vencedores e vencidos. Entre os vencidos jazem caídos na choça, ou quase nela, os meios tradicionais de comunicação, os quais vêem tremer os alicerces da sua hegemonia  gratuitamente herdada desde tempos imemoriais, enquanto do outro lado da barricada campeiam e pavoneiam-se os twitter´s, os instragam´s e afins, cujo potencial bélico arrasa tudo à sua passagem. Veja-se a vitória do ditador Bolsonaro e do “vilão” Trump. Lamentavelmente a imprensa e o audiovisual, numa tentativa ilusória de sobrevivência, deixam-se resvalar na promíscua miragem .dos seus rivais, servindo ao público o mesmo produto inquinado, o sensacionalismo soez, os escândalos sociais, sexuais e vicinais, as intermináveis mesas desportivas, tão redondas e ocas como a bola que discutem. Chega a ser deplorável, nauseabundo o antro em que vegetam certos conteúdos e certos centros emissores,
Entretanto, no meio pantanoso em que se afundam os habituais programas, fomos ontem surpreendidos por um lampejo de coerência e lucidez no visionamento de “PRÓS&CONTRAS”, onde  Fátima  Campos Ferreira teve a coragem de  trazer para a ribalta da nação o mundo tormentoso que percorre os subterrâneos da sociedade e que nós, intencionalmente ou não, tratamos de esconder como um tabu.
Expôs-se ali em palco e ‘ao vivo´ o drama dos CUIDADORES INFORMAIS. Pais que cuidam de um, dois e três filhos vítimas de paralisia infantil. Filhos que desistem do seu futuro profissional para tratar de um pai ou de uma mãe atacados de esquizofrenia. Uma esposa que tudo deixou para assistir, vinte e quatro horas sobre vinte e quatro horas, ao marido idoso, vítima de esclerose múltipla. Ninguém que visse o programa terá ficado de coração enxuto, ao percorrer esse cortejo pré-fúnebre que diante dos nossos olhos se foi desenrolando.
Só me ocorria ao subconsciente o sentido poema de Gomes Leal  - a “Senhora Duquesa de Brabante” diante do filho “raquítico, enfezado, excepcional, todo disforme, malquisto”.  Quando o “monstro” morreu houve festa no palácio, arraiais na ruas, o próprio pai ria às gargalhadas. Mas…
Só, sobre o esquife do disforme morto,
Chora, sem trégua, a mísera mulher
Chama os nomes mais ternos ao aborto
Mesmo assim feio, a triste mãe o quer
Mas naquele plenário familiar (todos, desde o ecrã até ao nosso divã, todos nos sentíamos irmãos da mesma família) o que mais me sobressaltou não foi  pranto nem desespero, mas a capacidade de resistência, “mais do que prometia a força humana”,  daqueles cuidadores, quase todas mulheres, de fronte erguida, sofrido sorriso no olhar, frescura estóica no rosto, expondo sem complexos os seus dramas e exigindo acompanhamento e apoios adequados por parte de quem governa .
E foi precisamente este valor mais alto – o da consistência psíquica de amar e resistir que  motivou hoje  o nosso “Senso&Consenso. Não. por masoquismo ou comiseração. Ver para crer. E querer. E agir. Poucas vezes se viu na TV um testemunho tão eloquente e mobilizador.
Por este Parlamento Maior do sofrimento humano, ou, como diz o Papa Francisco, por este superior “Hospital de Campanha”, na televisão pública, as minhas saudações!
13.Nov.18
Martins Júnior
          

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