Voltar ao LIVRO é encher a semana e
preencher todos os dias do ano. Porque dali emergem renovadas fontes de
inspiração que se traduzem em maior visibilidade da estrada e novo fôlego para
vencê-la.
Hoje e amanhã, trata-se da economia de
risco nas relações humanas, cujo activo incontornável chama-se capital-coragem.
Ganha-se a ciência e cultiva-se a arte do correcto e oportuno investimento
deste capital. É uma aprendizagem para toda a vida. E são muitos, talvez a
maioria, os que nunca chegam a entendê-la. Há ainda os que a confundem com calculismo,
artimanha, espionagem: são os peritos natos do maquiavelismo profissional, em
que “o fim justifica os meios”. E aplicam-no, o capital-coragem, com fria
audácia, persistente ou intermitente, ao serviço de causas duvidosas. É o
‘bunker’ privilegiado de uma certa casta de políticos, das máfias, do crime organizado.
Outro, porém, é o investimento do
capital-coragem. No topo dos lucros a obter está prioritariamente a definição
de um objectivo superior, o qual será sempre a dignificação da condição humana,
pela saúde, pelo pão, pela educação, pela justiça. pela reabilitação do
indivíduo e da sociedade. A prossecução ou a luta pelo objectivo proposto terá
necessariamente duas alavancas, sem as quais tudo será debalde: a coerência e a
persistência – coerência de acção e resiliência positiva que, em linguagem
comum, toma o nome de paciência expectante, mas sempre dinâmica. A todo este
compósito se resume o precioso capital-coragem e só os espíritos robustos
conseguem obtê-lo e rentabilizá-lo.
É-nos oferecido, hoje e amanhã, o
protótipo perfeito do capital-coragem e do seu correcto investimento. Basta
consultar o LIVRO e encontrá-lo-emos em Lucas 19, 1-10.
O líder das multidões, dos excluídos,
dos pecadores, dos pobres, das mulheres sinalizadas, tem contra si o poder
religioso e os detentores do dinheiro: os fariseus e os quadros superiores das
finanças públicas, entre os quais se conta Zaqueu, “príncipe dos publicanos”, o
equivalente a director geral de Contribuições e Impostos. “Muito rico, mas
ladrão”, odiado pelo povo. Em termos classistas e perante a opinião pública, um
abismo os separa: Jesus, amado pelo povo; Zaqueu, odiado pelo mesmo povo.
No entanto, o Nazareno não é fundamentalista e
vê mais além, perscruta a profundeza da psicologia humana e não hesita em
quebrar as barreiras que os ‘lobies’ sociais impedem de recuperar e reabilitar
quem intimamente o deseja. Zaqueu situa-se nessa margem, quer restituir o que
roubou. E aqui está o Nosso Mestre entre a espada e a parede, entre a transparência
e a hipocrisia, no limite, entre a perda da popularidade e a recuperação de um
ser humano. O povo não vai perdoar-lhe qualquer aproximação a Zaqueu.
Mas
decide-se. Recorre ao capital-coragem que traz infinitamente consigo e, desassombradamente
diante da grande multidão, interpela Zaqueu e diz-lhe: “Hoje, quero jantar em
tua casa”. O povo desilude-se, nem quer acreditar, dispersa-se contrariado por
esta traição do Mestre.
Mas
Jesus não recua, entra em casa de Zaqueu e, à mesa, deu-se o grande
sobressalto, terramoto de alma entre quatro paredes. Zaqueu abjurou os crimes
perpetrados contra terceiros, jurou restituir “quatro vezes mais”, enfim, regressaram
de novo a saúde e a alegria onde já
estavam mortas. E abriu-se o clarão de um novo dia no panorama social de toda a
Jerusalém.
“Um
passo atrás para dar muitos à frente” – já o fez o Filho do Carpinteiro de
Nazaré. Há dois mil anos. Com o capital-coragem e duas alavancas, coerência e
persistência, ao serviço de uma causa maior: o lugar cimeiro da Pessoa na
construção da Felicidade Colectiva. A grande tarefa dos Estados, das Escolas, das
Famílias!
29.Out.22
Martins Júnior
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