Nem
“São Lourenço” mudou de género nem as canções ‘tuneiras’ têm algo a ver com os tunídeos migrantes que
atravessam os mares da Madeira. No entanto, todos eles conversam na amurada - o título - deste cais
virtual dos Dias Ímpares.
A
Ponta de São Lourenço (que desde 1419 tomou o mesmo nome da caravela : ´´O São Lourenço chega! bradaram Tristão e Zargo aos corajosos
marinheiros) sim, a ponta-extremo-leste da Ilha e braço esquerdo de Machico,
rude e revolta, a Ponta de “São Lourenço” rumou até ao Funchal e entrou nos
salões doirados do Palácio que lhe usurpou a titularidade de registo, sem
contudo ofuscar-lhe o privilégio de ter sido ela a franquear a entrada dos
argonautas do Senhor Infante na nobre baía de Machico. O mar ‘tuneiro’ onde
viajou levou consigo melodias eternas, as de Mozart, de Beethoven, Strauss e
muitas outra que navegaram no convés (daí o nome) da Tuna de Câmara de Machico,
TCM.
Está
desvendado o pequeno enigma. A TCM teve a honra de abrir, anteontem, o auspicioso programa “O Natal do Palácio” – o
Palácio de São Lourenço. Em poucas palavras, os jovens manifestaram – e aqui
não faço mais que prolongar o eco dessa mensagem – o seu muito apreço pelo
convite que lhe foi formulado para apresentar ali, num meio eco-melódico
adequado e perfeito a genuína ‘música de câmara’ própria do seu reportório. Original
foi a participação presencial e efectiva da ‘Tuninha Infantil’ que emprestou ao
evento uma graciosidade diáfana, condizente com os natalícios motivos
ornamentais do salão, o que muito cativou o público assistente.
Duas
notas ficaram gravadas no ânimo de quem lá esteve. Primeiramente, a
circunstância, para nós inédita, de ver os jovens e crianças de uma zona rural,
como é a Ribeira Seca, subirem felizes a escadaria do Palácio e apreciarem a
beleza do mobiliário ancestral, de há quatrocentos anos (informaram-nos).
A
segunda nota, essa diz respeito ao público mais adulto, com memória. Não posso
esquecer-me de que, quando ocupada em 74-75-76 do século XX por um militar
autoritário anti-25 de Abril, aquela casa representou os resquícios do já defunto
fascismo, com ameaças e perseguições contra o povo madeirense. Foi dali,
daquele Palácio, que foram apontadas armas e lançadas bombas lacrimogéneas e
similares contra os camponeses produtores de cana de açúcar, uma enorme
multidão de toda a Madeira, reivindicando o pagamento de dois escudos e meio/Kg de cana.
Jamais esquecerei esse triste cenário, o povo transido de medo, mas sempre a
gritar pelo justo preço do seu produto.
Reminiscências
de outros tempos, contraditoriamente o tempo da libertação do Povo Português!
Ultrapassada hoje toda essa malfadada repressão, ao entrar naquela casa sentiu-se
a atmosfera de uma simpática receptividade que a todos nos tocou. Por ser Natal
e certamente ninguém terá levado a mal, improvisámos esta quadra, intercalada
no refrão popular madeirense:
O São Lourenço Primeiro
É o que está no Caniçal
O São Lourenço Segundo
Veio morar p´rao Funchal
Ao
Ex.mo Representante da República, Senhor Conselheiro Ireneu Barreto, os
melhores agradecimentos da TCM, extensivos aos competentes serviços sob a
tutela de Sua Excelência.
Feliz
Natal !
09.Dez.22
Martins Júnior
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